quarta-feira

A Capela de Laveiras: Uma História de Vontade




Insignificante do ponto de vista da monumentalidade que caracteriza grande parte dos edifícios de culto religioso da região de Lisboa, a Capela de Nossa Senhora das Dores, situada na povoação oeirense de Laveiras, é hoje um importante marco patrimonial daquele concelho. As vicissitudes muito próprias da sua História, demonstrando que, muitas vezes, a vontade colectiva é mais importante do que os percalços políticos pontuais, transformam-na em mais um repositório de memória que contribui para a consolidação da cidadania daquele que habitam nas suas redondezas.

Situada numa das mais interessantes povoações de cariz saloio do Concelho de Oeiras, a Capela de Nossa Senhora das Dores é um marco inestimável do poder de concretização que deriva da vontade popular.

Sem que se conheça com exactidão a data da construção original, que com toda a certeza deverá ser anterior ao Século XVII, este edifício situa-se na povoação de Laveiras, tendo sofrido ao longo dos anos variadas campanhas de obras que, sem lhe retirarem a simplicidade original, conseguiram mante-la num excelente estado de conservação.

Contrariamente àquilo que aconteceu com a generalidade dos edifícios religiosos portugueses, que atravessaram de forma complicada os tumultos provocados pelas diversas crises políticas que o País sofreu, a Capela de Laveiras possui uma história sui generis, que lhe confere um estatuto patrimonial diferente.

De acordo com J. de Vilhena Barbosa, que editou no final do Século XIX algumas notas sobre um possível roteiro de Lisboa, no qual incluía Oeiras e o seu Concelho, a Capela de Laveiras é “muito antiga nas suas origens”. Sem precisar datas ou nomes, o autor refere o Século XVII como a marca temporal mais exacta para a sua edificação, sublinhando ainda que a ajuda régia foi fundamental para, em conjunto com o empenho da população, se criar ali um núcleo cultual que servisse toda a envolvência.
Segundo Rodrigues Soares, autor dos textos que integram o livro “Retratos de Oeiras”, a edificação da Capela antecede a criação da própria Irmandade de Nossa Senhora das Dores, que foi formalizada somente em 1812.

Dessa data em diante, e uma vez mais contrariando a História de quase todos os templos existentes naquela época, a Capela de Laveiras, conhece um período de enorme prosperidade, uma vez que a recém criada Irmandade, para além dos assuntos relacionados com o culto e com a manutenção do edifício, desenvolve significativo trabalho educativo na região, criando em seu torno uma escola, e diversas actividades sociais.

É neste clima de laboriosa entrega que a Capela conhece os períodos difíceis do liberalismo e da perspectiva anti clerical do Estado, factores que, no entanto, acabaram por não afectar a fiel comunidade católica de Laveiras.

Mesmo com o incêndio que praticamente a destruiu no ano de 1870, a Capela de Nossa Senhora das Dores de Laveiras foi totalmente reconstruída, tendo inclusivamente sido ampliada na mesma época, e reabriu ao público em 1889, tal como consta de uma inscrição apensa numa das suas paredes exteriores.

Nessa recuperação desempenhou uma vez mais papel de relevo o Estado que, através do então Ministro das Obras Públicas, Emídio Navarro, auxiliou a Irmandade nas obras em curso.

Apesar das suas diminutas dimensões, e de ter perdido a utilização cultual em prol da capela do Convento da Cartuxa, em Caxias, a Capela de Laveiras manteve-se sempre como símbolo fundamental da vivência religiosa oeirense.

No início de um novo Século e de um novo Milénio, quando quase toda memória histórica e social das antigas aldeias dos arredores de Lisboa se está a perder como consequência do desenvolvimento de uma terceirização que transforma os arredores da Capital em meros dormitórios sem marca e sem passado, a Capela de Laveiras, assume-se como marco indiscutível de uma forma de estar na qual o Concelho de Oeiras desempenhou um papel fundamental.

A preservação deste monumento, bem como o necessário reenquadramento urbanístico que ele exige, garante aos habitantes locais a possibilidade de rentabilizarem a sua memória, promovendo uma socialização mais natural e efectiva, que contribua para a qualidade de vida de todos quantos ali têm a honra de viver.