sexta-feira

O Tratado de Lisboa


por João Aníbal Henriques


A pouco mais de dois dias de assumir (pela terceira vez) a Presidência da Comunidade Europeia, num acto de mais simbolismo do que de importância prática, o Governo de Sócrates indicou claramente ao Parlamento quais são as suas prioridades fundamentais para este importante período.

Contrariamente ao que seria de esperar, sobretudo se tivermos em conta o estado caótico em que se encontra o nosso Estado; a situação quase miserável em que estão a ser deixadas as famílias portuguesas, com um aumento brutal da carga fiscal, acompanhada pelo agravamento das taxas de juros e de uma inquietante possibilidade de a curto prazo perder regalias essenciais nas áreas da saúde, educação e segurança social; e a cada vez mais delirante perseguição que começaram a sofrer todos aqueles que têm o vil descaramento de discordar publicamente com o Governo, o Primeiro-Ministro ou um qualquer responsável político português; nenhuma das prioridades do PS para esta presidência tem qualquer coisa a haver com Portugal e os portugueses. Pelo contrário.

A única preocupação reside numa necessidade efectiva do Governo e do nosso actual Primeiro-Ministro: inscrever o seu nome na História da Europa. E para isso, no quadro de um possível futuro tratado europeu que terá consequência efectivas e permanentes no futuro do País e no dia-a-dia dos portugueses, opta-se por concentrar todos os esforços na assinatura do documento. E para quê? O Primeiro-Ministro respondeu de forma irredutível no Parlamento… para que se chame “Tratado de Lisboa”.

Como é evidente, porque o dito tratado ainda nem sequer foi redigido, não sabemos se será bom ou mau para Portugal. Agora que estamos na Europa, condenamos estamos também a fazer o melhor possível para acompanhar o que essa Europa faz (apesar de já estar provado que pouco ou nada temos a haver com ela). Mas o tratado em questão, independentemente da nossa opinião sobre ele, terá influência directa no nosso futuro Nacional e, quanto mais não fosse por isso, deveria ser sujeito à análise, consulta e decisão dos portugueses.

Para mim, que não me revejo na figura, nas escolhas, no posicionamento, nem na prática deste Governo e que, por isso, não me sinto representado por ele, é assustador pensar que quem não consegue responder cabalmente aos interesses de Portugal em questões práticas internas (o aeroporto, o TGV, a privatização dos hospitais, a degradação do ensino, etc. são apenas alguns exemplos), venha a ser o responsável por uma decisão que vai condicionar o meu futuro e o dos meus filhos.

Como português, e em nome de Portugal, não posso aceitar de ânimo leve que, em troca do nome de Sócrates e de Lisboa neste tratado, se tomem decisões nas quais os portugueses não são tidos em conta.