segunda-feira

A Capela do Livramento




Situada estrategicamente no centro da povoação do Livramento, muito próximo das entradas principais de algumas das maiores e mais produtivas quintas do concelho de Cascais, a Capela do Livramento é uma construção do final do século XVIII, como acontece, mercê da grande destruição provocada pelo terramoto de 1755, com a quase totalidade dos edifícios de culto do território de Cascais.

Muito embora não seja possível determinar com exactidão a data da primitiva edificação, pode dizer-se com alguma certeza que ela seria, certamente, muito antiga. A manutenção das estruturas simbólicas e religiosas das populações proto-cascalense, bem como a continuidade verificada em quase todas as áreas durante os períodos mais conturbados de transformação política, permite supor um certo carácter sagrado a quase todos os terrenos hoje ocupados por templos de culto católico.

Esta situação, que à partida parece pressupor a existência de rituais comuns a todas estas diferentes religiões, fica a dever-se, no entanto, às características de adaptabilidade que acompanham a vida da cristandade desde os seus primeiros anos de existência. De facto, quando se fala em culto católico, fala-se também numa congregação geral de muitas expressões religiosas anteriores que, com o objectivo de homogeneizar a vivência espiritual das populações, preparando-as para uma melhor aceitação das novas ideologias, promoveu o encontro de culturas e formas de ser.

A Capela do Livramento, exemplo muito positivo da forma como o património pode espelhar os resquícios meio apagados do devir histórico, representa actualmente um ponto de união para as populações envolventes, demonstrando também, e até à exaustão, a importância que possui a existência de um núcleo histórico bem consolidado na manutenção e desenvolvimento das relações de vizinhança. Estas por sua vez, tendem a facilitar a dignificação da instituição familiar que, por seu turno, promove o arreigado apego ao meio e à terra, factor condicionante da melhoria da qualidade de vida das populações.

As linhas simples da fachada deste edifício, bem como a forma exemplar como se encontra preservado, tornam-no num pólo aglomerador da população envolvente, que ali se encontra, aos fins de tarde e durante o fim-de-semana, para trocar impressões sobre os problemas do quotidiano. As diferentes gerações, ao contrário do que acontece na grande maioria das povoações cascalenses, possui um meio físico importante onde se pode reunir e trocar experiências.

Do ponto de vista plástico e arquitectónico, são de salientar, no adro da Capela do Livramento, um cruzeiro datado de 1757, bem como um conjunto bem preservado de um poço com bomba manual, peça importante na memória colectiva do Livramento, e que foi utilizado até quase à actualidade como elemento distribuidor de água para todo aquele espaço.

A planta rectangular do interior, a capela-mor abóbada e a passagem em arco de volta perfeita entre a capela e a capela-mor, permitem definir com rigor as datas da construção do templo. O chão de pedra e a balaustrada de madeira do coro, criam um ambiente de requintada simplicidade, coadjuvado, como é óbvio, pela ambiência criada pelas pequenas janelas colocadas em longo de todo o corpo principal.

As imagens da Virgem com o Menino, bem como as figuras imponentes de São Sebastião e de São José, completam um espólio artístico que, embora pobre, dignifica, pela forma como está preservado, a memória colectiva do Livramento, e o património cultural do concelho de Cascais.