por João Aníbal Henriques
A reconquista Cristã e a entrada
de novas gentes no actual território da Península de Lisboa, veio afectar de
sobremaneira o Concelho de Cascais. É ponto assente entre os estudiosos da
matéria, que Cascais exista já em 1147 e que foi alvo do interesse do novo rei
de Portugal, Dom Afonso Henriques.
Segundo Pedro Barruncho, na sua
obra “Villa e Concelho de Cascais”, datada de 1873, “é mais provável, para
começarmos em mais próximos tempos, que pouco antes ou depois da tomada do
Castelo de Cintra, se não ao mesmo tempo, o lugar de Cascaes entrasse no
domínio do novo reino Lusitano”.
Esse facto é por demais evidente
se nos debruçarmos mais profundamente sobre o Foral de Dom Manuel em que se
pode ler acerca das preocupações que tanto Dom Afonso Henriques como Dom Sancho
I tiveram em relação a este pequeno território: “Achámos visto os foraes por
El-Rei D. Affonso Henriques e por El-Rei D. Sancho seu filho que os direitos e
foros da dita villa de Cascaes sa hão-de arrecadar e pagar d’aqui em diante na
maneira e formas seguintes […]”.
Este documento, com data de 15 de
Novembro de 1514, é ponto fulcral de mudança e transição no estudo da História
da Vila de Cascais a nível demográfico. Por um lado, ele comprova a importância
da vila para os monarcas das primeira e segunda dinastias, quer seja a nível
militar e estratégico, como defesa do estuário do Tejo perante as ameaças
Almorávidas, quer a nível político. Por outro lado, ele diz-nos que Cascais
possuía já um número razoável de habitantes que lhe permitia alguma expressão
ao nível dos centros de poder governamental.
Assim, e tendo presente a
subjugação administrativa a Sintra que Cascais sofria nessa época, podemos
vislumbrar de forma mais linear a curva demográfica da vila durante este
período já longínquo da História. É facto assente que desde épocas remotas
existiria uma estrada que garantiria a ligação a Lisboa. Essa estrada,
designada por “Caminho Velho” em certos documentos medievais, existiria já
desde o tempo dos Romanos e possuiria uma extensão que estabeleceria a ligação
a Sintra. Por este motivo, e porque Sintra dependia de Cascais e do seu porto
para a exportação, pois a única solução para transportar produtos perecíveis
para Lisboa era por mar, lógico seria que Cascai tivesse já nesta altura um
contingente significativo de homens do mar que, conjuntamente com as suas
famílias, se dedicassem à arte de marear. Tal facto é confirmado por José d’Encarnação
e Guilherme Cardoso que se têm dedicado à procura da origem do povoamento do
território Cascalense: “Uma das preocupações que temos é precisamente a de
localizar os vestígios dessa via quando se faz qualquer urbanização no
Concelho, uma vez que é muito provável que existisse, e existia mesmo, não
temos dúvida nenhuma (temos documentos medievais que nos falam por exemplo na
via velha, no caminho velho). É, portanto, possível que esse caminho velho
fosse um caminho já utilizado no tempo dos Romanos – tinha forçosamente de
existir uma estrada de Lisboa para Cascais, pois ao contrário do que se pensa,
eles preferiam afastar-se do mar”.
Cascais foi, por isso, causa e
efeito da reconquista Cristã, pois que, com o seu porto, contribui fortemente
para o desembarque das naus da referida reconquista. Por outro lado, essa mesma
reconquista contribuiu por sua vez para um desvanecer das fronteiras a Sul, e a
consequente estabilidade que dela resultou contribuiu de forma decisiva para a
facilitação do povoamento do território que, a par com a expansão demográfica e
económica da Europa, vêm facilitar o desabrochar de novas povoações e o
crescimento das já existentes.
Como é evidente, nem todos
concordam linearmente com esta premissa. Oliveira Marques, por exemplo,
contradiz-se ao referir-se a Cascais da seguinte maneira: “Apesar de todos
estes povoamentos, o território de Cascais – como aliás toda a região litoral a
Ocidente de Lisboa – era considerada como terra bravia e despovoada nos começos
da nacionalidade”. Mas mais à frente, na mesma obra, acaba por atestar a importância
de Cascais ao sublinhar a relevância da entrega do “Sturil”, actual lugar do
Estoril, a Estevão Eanes, valido de Dom Afonso III, que comprova a importância
daquele que é hoje o território municipal Cascalense.