por João Aníbal Henriques
Em Julho e Agosto de 1941, num contexto internacional marcado pela II
Guerra Mundial, a República Portuguesa teve necessidade de afirmar a
importância do Arquipélago dos Açores para a soberania nacional. Para tal,
cumprindo aquele que era um desiderato sempre adiado desde a viagem efectuada
àquele território pelo Rei Dom Carlos e pela Rainha Dona Amélia, o então Chefe
de Estado, o General Óscar Fragoso Carmona, fez uma visita oficial preparada
com minúcia e muito cuidado e apoiada por uma campanha de comunicação nunca
vista em Portugal.
Com o perigo eminente de um ataque alemão àquela que era estrategicamente
uma das mais importantes rotas de fuga numa Europa em guerra, os Açores eram
igualmente visitados pelos interesses particulares de ingleses e americanos que
Portugal tinha de rebater, afirmando-se historicamente como o país proprietário
daquele território ultramarino. A visita do General Carmona foi, deste modo, a
forma encontrada para propagar junto de todo o Mundo a soberania portuguesa
sobre os açores e, no contexto da guerra, reforçar a importância de Portugal
enquanto parceiro estratégico das potencias beligerantes mesmo mantendo a sua
bem conhecida neutralidade política.
Tendo corrido da melhor forma e cumprido integralmente os propósitos para
os quais havia sido concebida, a visita do Presidente da República aos Açores
fez manchetes em toda a comunicação social nacional e internacional, levando
consigo a mensagem subliminar do Estado Português, e enchendo de orgulho e de
esperança os portugueses que viam nos dirigentes do Estado Novo a solução mais
pragmática para os muitos problemas que afectam cronicamente Portugal desde há
demasiadas décadas.
Como no resto do País, Cascais vibrou de forma entusiasmada como os ecos
desta viagem. E os cascalenses, cientes do facto de a sua vila ter sido
escolhida pelo histórico presidente para sua residência oficial, impavam de
orgulho perante o sucesso alcançado por aquele que eles consideravam um deles.
O mais entusiasmado dos cascalenses com o êxito da iniciativa foi José
Florindo d’Oliveira, o dirigente de sempre da Propaganda de Cascais que,
politicamente muito próximo dos ideais propagados pelo Estado, aproveitava
todas as oportunidades para contribuir activamente para que a sua terra fizesse
parte do grande plano de salvar Portugal. E nesta ocasião, mesmo contra as
opiniões oficiais que pediam às entidades locais que se alheassem da viagem do
Presidente da República aos Açores, Florindo d’Oliveira teimou em organizar a
sociedade civil cascalense para receber de forma gloriosa o General Carmona no
seu regresso à Cidadela de Cascais depois de tão retumbante êxito alcançado em
terras açorianas.
Em conluio com o Presidente da Câmara Municipal de Cascais, José Roberto
Raposo Pessoa, organizou uma festa de boas-vindas ao Chefe de Estado marcada de
forma brilhante por um convite feito a todos os cascalenses que possuíssem
automóveis, de forma a que se concentrassem à entrada do território municipal,
junto à Fortaleza de São Julião da Barra, acompanhando em desfile a entrada do General
Carmona em Cascais e acompanhando-o ao longo da Avenida Marginal, em cortejo
embandeirado, até à residência oficial na Cidadela.
Dizia Florindo d’Oliveira num panfleto que encheu todas as caixas de
correio do Concelho de Cascais: “Preparemo-nos para festivamente aguardar a
chegada do Exmº. Senhor Presidente da República! Depois da triunfal visita aos
Açores o Chefe da Nação tornou-se ainda mais querido aos nossos corações! A
admiração que temos por Sua Excelência, o respeito que nos inspira o alto
cargo, que tão elevadamente desempenha, aumentam com as manifestações de
carinho, admiração e respeito que todos os nossos concidadãos lhe tributam.
Recebamos grandiosamente, na volta ao seu lar nesta nossa vila, o Exmº. Senhor
General Carmona e a Sua Exmª. Família! Regosijarmo-nos pela sua feliz viagem é
abraçar também o Portugal Insular, pela nobreza com que recebeu o Chefe da
Nação comum! Gritar bem alto que muito queremos ao preclaríssimo Chefe da Nação
é dizer ao Mundo o nosso amor a Portugal!”
E o povo de Cascais respondeu à altura ao apelo de Florindo d’Oliveira e
José Raposo Pessoa, literalmente entupindo a Avenida Marginal, entre a entrada
por Carcavelos e a Cidadela de Cascais, com milhares de automóveis ostentando
orgulhosamente centenas de bandeiras de Portugal, e acompanhados ao longo da
estrada e enchendo os passeios, por milhares de Cascalenses que gritavam
apoteoticamente pelo seu vizinho Presidente.
A reacção do Chefe de Estado não se fez esperar e no mesmo dia, através de
telegrama enviado para a Câmara Municipal e para a Sociedade Propaganda de
Cascais, o General Óscar Carmona agradece de forma sincera e reconhecida a
iniciativa da Sociedade Propaganda, da Câmara Municipal, na pessoa do seu
Presidente e dos Vereadores, e de todas as entidades públicas e privadas que
contribuíram para a organização deste evento, sublinhando o quão importante
havia sido para ele e para a sua esposa essa grande manifestação de carinho por
parte dos cascalenses. Diz ele que foi “uma manifestação que lhe calou muito no
seu espírito e que jamais esquecerá!”
Nas contas apresentadas no final do evento, verifica-se que o investimento
dos cascalenses no mesmo ascendeu a
602$50, a que se somaram cerca de 300$00 que foram pagos directamente pela
Junta de Turismo de Cascais para impressão dos cerca de 10.000 convites
distribuídos à população, e mais 600$00 relativos à oferta de foguetes e
morteiros lançados durante a festa e que foram pagos pelo Grupo Desportivo
Estoril Plage.
Fotografias do AHMC – Arquivo Histórico Municipal de Cascais