quarta-feira

O Hipódromo Municipal Manuel Possolo em Cascais



por João Aníbal Henriques

Sendo peça essencial na determinação da memória identitária de Cascais, o Hipódromo Manuel Possolo representa o culminar de uma história muito longa de ligação de Cascais aos cavalos e ao hipismo que porventura remonta há mais de 2000 anos.

De facto, datado dos primeiros anos da Era Cristã, foi encontrada na Villa Romana de Freiria uma pedra de um vetusto anel representando uma biga, ou seja, um pequeno veículo puxado por dois cavalos destinado a grandes velocidades e a competições hípicas. E esta história, perdida nos anais da história cascalense, terá sido o arranque de um processo longo que culminou, em 1936, com a concretização do velho sonho de Manuel Possolo de criação de um equipamento moderno que pudesse albergar com dignidade os muitos concursos hípicos que nessa altura e por sua direcção aconteciam na vila.



Não existindo muita documentação que nos ateste os passos que levaram à construção do hipódromo, diz-nos o ilustre historiador cascalense José d’Encarnação que o primeiro passo foi dado por iniciativa do Visconde dos Olivais. A pedido de José Florindo d’Oliveira e de Manuel Possolo, que tinham fundado a Sociedade Propaganda de Cascais alguns anos antes, o ilustre benemérito ofereceu à nova instituição uma parte dos seus terrenos situados na zona do Parque do Gandarinha para ali se realizarem as provas hípicas que aquela instituição realizava precariamente no fosso da Cidadela.

Pouco tempo depois, mercê da necessidade de aumentar o espaço e começar a construção das bancadas situadas sobre o braço da Ribeira dos Mochos que atravessa a propriedade da Família Avillez, recebeu a Sociedade Propaganda mais um pedaço de terreno para anexar ao novo hipódromo que foi oferecido à Câmara Municipal de Cascais como contrapartida pelo extraordinário projecto de urbanização que a Família Espírito-Santo pretendia fazer entre as Casas do Gandarinha e o cruzeiro que lhes pertencia nos terrenos existentes a Oeste da Boca do Inferno.



O terceiro pedaço de terreno anexado ao novo equipamento foi, de acordo com o apontamento da autoria do já mencionado José d’Encarnação, adquirido pela câmara à Firma “Fomento Urbano”, pelo valor de 536.800$00 e com uma área total de 3984 metros quadrados. Nesse espaço, situado a Poente do relvado, construiu-se o picadeiro e ali se instalavam as boxes que guardavam os cavalos trazidos das mais variadas partes do País e do Mundo quando aqui se realizavam os grandes concursos hípicos que animaram Cascais durante muito tempo.

Por fim, sem que se perceba muito bem como é que o processo administrativo se deu, a Câmara Municipal anexou ao equipamento um terreno de semeadura que acompanhava as margens da ribeira e que é hoje o relvado principal do hipódromo. Estávamos em 1960 quando a edilidade procedeu ao registo dessa parcela, atribuindo-lhe um valor matricial de 940.000$00. Aqui, durante muitos anos e por iniciativa da Sociedade Propaganda, realizavam-se vários eventos hípicos e taurinos, utilizando-se para tal uma estrutura amovível de madeira que era montada e desmontada para cada um dos eventos.

O terreno situado em frente ao Clube da Parada, onde actualmente se encontra o parque de estacionamento, era desde sempre propriedade da Câmara Municipal, tendo servido durante muitos anos para a construção de uma das mais famosas praças de touros de Cascais, pela qual passaram os grandes nomes da tauromaquia nacional e, nas bancadas, as mais ilustres personalidades do reino, a começar pela Família Real, sempre que estava a gozar o seu período de veraneio estival na nossa terra. Como refere Manuel Eugénio Fernandes da Silva, no seu livro sobre as touradas em Cascais, esta praça de touros foi construída em alvenaria, tendo sido posteriormente demolida para a construção da Monumental de Cascais, situada no Bairro do Rosário, e criando o espaço necessário para a construção do mítico Pavilhão do Dramático.



O espaço sobejante, ou seja, o pedaço de terreno que existia nas traseiras do ringue de hóquei do Dramático de Cascais, e que confrontava com o equipamento hípico, foi nessa altura alugado pela câmara à Sociedade Propaganda de Cascais por 500$00 mensais, de forma a poder ser utilizado como campo de aquecimento para os cavalos que disputavam os concursos hípicos realizados no hipódromo.

Esta amálgama de histórias e de variados espaços que confluem para a criação do Hipódromo de Cascais, resultam em primeira instância do trabalho realizado por Manuel Possolo que, sem descanso, nunca desistiu de empreender todos os contactos, pressões e explicações para que o poder político vigente apoiasse as pretensões de Cascais a ter um hipódromo ao nível do melhor que existia no mundo hípico de então. Mas, sem grandes fundamentos documentais, foram necessários os esforços de todos para que fosse possível levar a bom porto o cumprimento deste comum desiderato.



Em 1993, perante as mudanças que se avizinhavam nos equilíbrios políticos municipais, a edilidade resolve, sob proposta do Vereador João Reixa, regularizar toda a situação assinando um protocolo global com a Sociedade Propaganda de Cascais que, com a duração de 50 anos a contar dessa data, garantisse que o equipamento continuaria incólume e a desenvolver as suas funções hípicas. O preço simbólico de renda de 1.000$00 por ano, pretendia, de acordo com os pressupostos da proposta que foi aprovada em reunião de câmara, reconhecer o trabalho que a Sociedade Propaganda de Cascais vinha fazendo há muitas décadas na área do desporto hípico municipal. E assim, esta insigne instituição assume o encargo de zelar e manter o hipódromo e de o rentabilizar desportivamente até 2043, estando previsto igualmente a renovação automática consecutiva por períodos de 10 anos depois dessa data.

Profundamente marcado pelas memórias de muitas dezenas de concursos hípicos que ali se realizaram durante muitas décadas, o Hipódromo de Cascais carrega consigo a responsabilidade de manter viva a recordação de Manuel Possolo. O ilustre cascalense que criou o equipamento e que tanto contribuiu para levar bem longe o nome e a fama de Cascais, faleceu na sua casa, situada na Rua Carvalho Araújo, envolvido pela auréola mítica que nasceu com a sua prolífera actividade no universo municipal.


Fotografias @ Arquivo Histórico Municipal de Cascais



segunda-feira

Joaquim da Galera Homenageado na Toponímia de Cascais



por João Aníbal Henriques


Numa iniciativa conjunta da Junta de Freguesia de Cascais e Estoril e do Vice-Presidente da Câmara municipal de Cascais, Nuno Piteira Lopes, Cascais homenageou Joaquim da Piedade Aguiar, atribuindo o seu nome à rotunda situada junto ao lugar onde nasceu.  Ao fazê-lo, num preito de homenagem e gratidão, reconhecendo a entrega, a coragem, a determinação e o amor a Cascais que Joaquim da Piedade Aguiar, o mítico Joaquim da Galera bem conhecido por todos os cascalenses, devotou a esta nossa terra ao longo de toda a sua vida.


São infelizmente raros aqueles que com o dom da sua vida conseguiram dedicá-la, assim a 100%, à terra onde nasceram e onde sempre viveram, deixando atrás de si um rasto extraordinário que teve, tem e terá repercussões directas na Identidade Municipal e na qualidade de vida de milhares de cascalenses. E o Joaquim da Galera fê-lo!




Joaquim da Piedade Aguiar é uma das mais incontornáveis personagens do Cascais em que hoje vivemos. Nascido ali mesmo, na Rua Freitas Reis, no dia 24 de Fevereiro de 1938, cresceu sob a chancela de um grande dinamismo que atravessava longitudinalmente todo aquele extraordinário recanto de Cascais.


Empregado de comércio conhecido por todos os cascalenses, com aquele seu jeito inato que tornava especiais todos os clientes que pelas suas mãos passavam, depressa se impôs no panorama comercial de Cascais. No início da sua vida profissional esteve ligado à mítica Casa Tomaz e, desde cedo, marcou definitivamente a forma de bem receber e de servir quem procurava encontrar roupa e demais acessórios de vestuário.


Em 1974, com as oportunidades que se multiplicavam como resultado do caos revolucionário, Joaquim Aguiar identificou uma loja situada junto à Estação de Comboios com o potencial para se estabelecer por conta própria e para se afirmar no comércio de Cascais. Inicialmente numa parceria com Armindo Mestrinho, seu antigo colega na Casa Tomaz e, depois, associado à sua mulher, abriu ao público a Galera Modas que durante muitos anos foi referência incontornável da moda em Cascais e em Portugal. Juntando mais tarde a Boutique Glória ao seu já vasto negócio, depressa Joaquim Aguiar se transformou num motor da sociedade civil de Cascais, tendo participado e apoiado em quase todas as iniciativas e projectos que foram desenvolvidos no concelho até à actualidade.


O segredo de Joaquim da Piedade Aguiar, para além da sua natural apetência para o negócio e da imensa experiência acumulado durante os vinte e dois anos em que trabalhou na Casa Tomaz estava na sua inata habilidade estética e numa extraordinária força de vontade.


Nas suas lojas, sempre um passo à frente do seu tempo, toda a mercadoria exposta era apresentada de forma irrepreensível. O carácter inovador das suas montras, sempre motivo de especial atenção por parte dos seus conterrâneos que corriam a vê-las quando as inaugurava, tornavam a disposição dos seus artigos em autênticas exposições de arte. E isso, aliado ao facto de permanentemente correr o Mundo em busca das melhores colecções, dos criativos mais vanguardistas e dos materiais e marcas mais exclusivos, depressa tornaram a Galera no espaço onde chegavam clientes de todo o lado, cientes de que a maior parte do que de excelente ali se vendia não seria vendido em nenhum outro lado. João Aguiar, seu filho, transcreve no livro comemorativo do cinquentenário da Galera, um interessantíssimo apontamento publicado pelo Jornal da Costa do Sol logo em Outubro de 1974, poucos meses depois da abertura oficial da loja que tanto interesse havia despertado: “A princípio hesita-se em entrar. Todo o Mundo para diante da montra panorâmica, espreitando gulosamente o bem-apresentado recheio, onde de tudo se encontra: a última novidade em modas para todas as idades, das mais conceituadas marcas de pronto-a-vestir. Hesita-se porque – pela aparência – se suspeita de loja para bolsas recheadas! Loja onde se pague o luxo que, em verdade, não existe ali pois aquilo não é luxo, é tão-somente bom gosto, o savoir-faire. E de quem há muitos anos trabalha no ramo. As pessoas param, admiram, admiram-se e entram!”.


Joaquim da Galera, cujo nome se confunde com o pulsar constante da Vila de Cascais, rapidamente transformou o êxito que alcançou enquanto empresário numa verdadeira mola propulsora da vida da sua terra. Focado sempre no bem-comum, com a capacidade de identificar com rigor o mérito e as virtudes dos seus conterrâneos, ele multiplica a sua presença nas colectividades e associações de cascalenses, sempre com o seu carisma de organizador em grande destaque e a capacidade de liderar e garantir que todos dão igualmente o seu melhor para que Cascais preserve aquele seu charme que faz chegar longe a sua fama. Mas não se pense que Joaquim da Galera é o líder que assiste impávido ao trabalho dos outros, ordenando do alto do seu altar as directrizes que garantem o cumprimento dos seus projectos. Muito pelo contrário! Onde há projectos trabalhosos, que exigem entrega física e esforço, eis que é ele o primeiro a conduzir as suas carrinhas de carga, a carregar vasos de flores e a ajudar a organizar as mesas onde mais tarde também ele se vai sentar.


Da Sociedade Propaganda de Cascais, onde os concursos hípicos lhe exigem uma entrega sem par, até às comemorações oficiais do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, até à Associação Comercial de Cascais, o dia de Joaquim Aguiar parece ter a capacidade de multiplicar as suas horas, porque para onde quer que olhemos, se o mote é Cascais e se o ambiente é de alegria e festa, lá está ele a trabalhar. Igualmente nas associações de moradores da baixa de Cascais, na Sociedade Musical de Cascais, na Associação de Bombeiros e no magnífico Teatro Gil Vicente, é Joaquim da Galera que tem as ideias, quem as materializa e quem tem a arte de acicatar os ânimos e pôr toda a comunidade a trabalhar empenhadamente nestes eventos que dão forma à própria vida de Cascais.


Ao longo da sua longa vida, Joaquim da Piedade Aguiar foi presença constante em quase tudo o que se passava em Cascais. No Natal, quando os comerciantes rebuscavam ideias para materializar campanhas que motivassem as vendas e as visitas de forasteiros que por aqui deambulavam em busca dos produtos que só se encontravam em Cascais, era ele quem estava por detrás dos concursos de montras, do embelezamento dos canteiros públicos e sistematicamente era ele quem organizava as iluminações que enchiam as ruas da vila de animação e música, multiplicando os ecos juntos dos principais órgãos de comunicação social e, criando tracção, reforçavam a mística de Cascais. E no Carnaval, quem não se recorda dos magníficos e muito animados corsos que ligavam Cascais ao Estoril e que exigiam meses e mais meses de preparação e trabalho? Está visto que, neste grande evento que juntava milhares de visitantes ao longo de todo o percurso, era quase sempre o carro alegórico da Galera Modas aquele que mais curiosidade despertava, não só pelo cuidado na sua preparação, como pela animação que o Joaquim da Galera nele colocava! À noite, quando o cansaço tomava conta dos foliões, não era raro ouvir-se ao longe a música e as gargalhadas de grupos que percorriam a vila reforçando a animação. E quase sempre, como o sabem todos os cascalenses, era o Joaquim da Galera quem lá estava mascarado e sempre disposto a pregar partidas que se tornaram míticas e que geraram histórias e memórias que passaram a fazer parte das Histórias de Cascais!


Dos muitos projectos e organizações de que fez parte, houve um que transcendeu todos os demais pelas repercussões que teve na vida de Cascais. Em 1993, em conjunto com as mais importantes personalidades que lideravam a designada Sociedade Civil de Cascais, esteve o Joaquim da Galera à frente da secção de comércio e animação cultural da recém-criada Fundação Cascais. Foi um trabalho duro aquele que foi feito naquela instituição, lutando permanentemente pela sua independências perante interesses políticos e partidários, e tendo como mote unicamente o bem comum dos cascalenses. Dizia-se que era uma utopia inalcançável a Fundação Cascais. Mas em conjunto com Isabel Olavo, António Aguiar, Luís Athayde, Pedro Canelas, Pedro Luís Cardoso, Carlos Olavo, João de Castro, Vieira da Fonseca, João Coelho Pinto, Jorge Marques, Pedro Garcia e tantos outros, lá esteve Joaquim Aguiar como fundador e administrador da Fundação Cascais garantindo que a instituição tinha as condições necessárias para cumprir os seus muitos desideratos.




A sede da instituição, instalada numa sala dentro da sede da Sociedade Propaganda, que ele próprio preparou para ali instalar a fundação, transformou-se num cadinho de movimento e animação, com discussões acaloradas sobre o futuro comum da terra magnífica que era o Cascais de então. E logo naquele primeiro ano, durante a campanha para as eleições autárquicas, pela sede da Fundação Cascais passaram todos os candidatos de todos os partidos que, num registo de respeito comum pelas opiniões alheias, vieram dizer aos Cascalenses ao que vinham e o que traziam para oferecer à nossa terra.

O trabalho preparatório, feito com a ajuda de imensos cooperantes que voluntariamente se reuniam aquele conjunto de homens-bons do concelho, foi feito com levantamentos sistemáticos de informação em cada uma das áreas prioritárias de intervenção, que eram posteriormente trabalhadas em conjunto em reuniões plenárias e das quais resultaram projectos de intervenção que no campo alteraram radicalmente o futuro de Cascais. Sempre com presença activa de Joaquim Aguiar, vale a pena lembrar os concursos de arte, os concursos de montras, os torneios de futebol juvenil, o levantamento exaustivo do património histórico de todo o concelho de Cascais, os estudos sobre alcoolismo juvenil, a associação de apoio e desafio à SIDA, as peças de teatro com fins beneméritos, o apoio ao trabalho feito pela Irmã Elvira no Bairro do Fim-do-Mundo, o seminário sobre turismo e políticas de promoção internacional de Cascais que deram forma a novas estratégias de captação de visitantes que vieram consolidar a vocação turística municipal. E nas edições, o livro sobre a História da Paróquia do Estoril, a publicação do levantamento do património, o livro sobre o Plano Director Municipal, as revistas sectoriais sobre a realidade de Cascais, o livro sobre Urbanismo & Comércio e tantas outras publicações que ainda hoje continuam a ser referência inultrapassável para quem pretende estudar a realidade municipal de Cascais. E, porventura o mais importante de todos os trabalhos desenvolvidos pela Fundação Cascais e no qual Joaquim da Piedade Aguiar foi peça-angular na sua concretização: o grande estudo sobre saúde que culminou com uma mega-reunião no Teatro Gil Vicente onde estiveram em aberta discussão os profissionais de saúde, os autarcas de Cascais, os representantes da sociedade civil e do turismo e ainda o então Ministro da Saúde. Desse trabalho, imenso e aparentemente inconcretizável, resultou a publicação do livro “Tratar da Saúde de Cascais”, com um conjunto de propostas que tornou possível a construção do novo hospital de Cascais e a recuperação da totalidade das estruturas de saúde primárias em todas as freguesias do concelho.

Foi também obra em que ele se empenhou e que teve repercussões drásticas na vida de Cascais e dos Cascalenses com um rasto que se prolonga ao longo dos anos e que se repercute ao longo de muitas gerações de Cascalenses.

No boletim que publicou durante vários anos para promover a sua Galera Modas, e que surge transcrito na obra atrás mencionada, diz-se no primeiro número datado de 1975 que o lema de Joaquim da Piedade Aguiar assentava em três palavras fundamentais: Vontade, Trabalho e Ousadia. E serão porventura estas as palavras que melhor descrevem quem é Joaquim da Galera, e que explicam o impacto que ele tem junto dos seus conterrâneos.

A excelência do Joaquim da Galera e a entrega de vida a Cascais só vale a pena se for reconhecida por todos. Até porque Cascais seria uma terra diferente, para pior, se não fosse a vida dele!


Fotografias @ Junta de Freguesia de Cascais e Estoril – Susana Meireles


sexta-feira

A Capela de Nossa Senhora de Porto Salvo em Oeiras



por João Aníbal Henriques

Quem entra por mar na Barra do Tejo, provavelmente procurando chegar à sempre mítica Cidade de Lisboa, orienta a navegação através da interpretação dos sinais que vai vendo ao longo das margens. O primeiro e mais importante, definindo a rota que permite discernir a entrada na Grande Barra, é o Alto de Caspolima, onde hoje se ergue a Vila de Porto Salvo.

O próprio topónimo desta importante freguesia do Concelho de Oeiras é, aliás, a tradução linear dessa relação que aquele espaço tem com o mar e com o acesso a Lisboa através da Barra do Rio Tejo. Porque, diz uma das correntes que procura explicar a origem da localidade, os marinheiros entendiam o avistamento daquele morro como sinal da chegada em segurança ao Porto de Lisboa. E, dessa maneira, assumiram então que a inovação de Nossa Senhora de Porto Salvo seria aquela que melhor definiria o ensejo de chegar de forma segura ao seu destino.




Na sua versão mais romântica, provavelmente misturando os resquícios de uma lenda antiquíssima com a realidade vivida neste local desde tempos imemoriais, terão sido uns marinheiros da Carreira das Índias que, num dia particularmente difícil de grande temporal vivido angustiosamente no Cabo das Tormentas, terão feito um voto a Nossa Senhora prometendo construir uma pequena ermida no morro de Caspolima caso a sua protecção lhes permitisse regressar em segurança a Lisboa. Dessa maneira, seria essa a origem da construção da airosa capela que ainda hoje marca de forma charmosa a paisagem naquelas terras.

O topónimo antigo – Caspolima – terá então caído em desuso, à medida em que crescia a comunidade de devotos seguidores da protecção que Nossa Senhora de Porto Salvo sempre oferece a todos os navegadores que a invocam.

Segundo informação da própria Junta de Freguesia de Porto Salvo, era usual que os navios que procuravam chegar ao Porto de Lisboa disparassem sempre uma salva de 21 tiros quando avistavam a pequena capela, homenageando assim a padroeira da localidade e consagrando-lhe o sucesso das suas viagens. De acordo com aquela Autarquia, esse costume prolongou-se ao longo do Século XIX tendo progressivamente desparecido ao longo da centúria seguinte.



Vincadamente inserida na tipologia própria das antigas capelas rurais que proliferam nas imediações rurais do termo de Lisboa, a Capela de Porto Salvo apresenta, no entanto, características únicas que a demarcam das suas congéneres. Basicamente porque, com o crescimento desmesurado que conheceram as terras de Oeiras ao longo do Século XVIII, ela tenha sido reconstruída, ganhando detalhes decorativos que se afiguram deveras marcantes. É o caso dos painéis de azulejos que decoram a sua fachada e que retratam os milagres atribuídos a Nossa Senhora de Porto Salvo, de autoria atribuída a Oliveira Bernardes e datados de 1740, bem como a construção do alpendre adossado ao corpo principal que oferece ao lugar um toque de requinte que acompanha ao aumento exponencial do número de devotos que procuravam o espaço para expressar a sua Fé em Nossa Senhora.

Com origem definida para o Século XVI, consagrando assim a versão lendária da sua fundação e a ligação ao mar e ao grande empreendimento dos Descobrimentos Portugueses, a Capela de Porto Salvo foi alvo de dois grandes momentos de ampliação em épocas posteriores que alteraram de forma quase radical a simplicidade original da antiga ermida seiscentista.



O que não se alterou, senão no multiplicar devocional, foi a orientação primitiva que se associa a este espaço. O cunho mariano, onde Nossa Senhora, Mãe de Jesus, se assume como fulcro de Fé e fonte de protecção, está plasmado de sobremaneira nos várias elementos arquitectónicos que actualmente caracterizam este templo. No interior, ao longo da sua única nave, a capela integra uma interessantíssima descrição em azulejos azuis e brancos da Fuga para o Egipto, numa alusão, provavelmente algo velada, da forma como a intervenção da Mãe-Primordial é ela própria o garante da segurança dos seus filhos. E em todo o espaço sagrado, são as litanias a Nossa Senhora que melhor descrevem essa entrega devocional à Rainha de Portugal, na certeza bem vincada que quem se lhe dedica fica imediatamente protegido de maiores males.

O recinto da capela, envolvido por um murete que acompanha as práticas devocionais durante os períodos de festa em honra da padroeira, permite-nos perceber que a expressão simbólica da religiosidade local desde sempre foi acompanhada de uma movimentação expressivamente pagã, com festas e arraial que prolongava pela localidade a singeleza dos monumentos religiosamente mais relevantes.



A Capela de Nossa Senhora de Porto Salvo é actualmente marco efectivo da forma como se consolidou a vivência humana no território municipal oeirense. E, nas suas características formais, define com rigor a capacidade que localmente se criou de mesclar o paganismo ancestral às práticas religiosas cristãs e católicas, recriando um percurso de continuidade que afirma de sobremaneira o respeito pela diferença de opiniões e de crenças que permanentemente por aqui grassou.

É de visita obrigatória para quem pretende perceber a importância que o Termo de Lisboa teve no desenvolvimento renascentista de Portugal, e na forma como a devoção religiosa das suas gentes foi fundamental para formatar socialmente a sua estrutura comunitária.


segunda-feira

O Papel Sagrado da Mãe em Santa Eufémia de Sintra



por João Aníbal Henriques

O papel de mãe é provavelmente o principal alicerce civilizacional que define o dealbar da nossa humanidade. E, no que a Portugal diz respeito, ele surge plasmado num dos recantos mais extraordinários da Serra de Sintra, carregando consigo os segredos descodificadores da própria portugalidade.

No topo das penhas verdejantes da Serra de Cinthya, numa sempre velada alusão à matriz lunar da nossa existência, a efemeridade temporal da vida transmuta-se na convincente eternidade da essência primordial. E, através de um secreto processo alquímico guardado de forma cuidada ao longo dos milénios, é ali que a poalha despojada dos resquícios do Ego ganha forma e vida, assumindo-se como cadinho de outras vidas sempre condenadas ao regresso ao eterno.

Santa Eufémia de Sintra, onde desde a Pré-História se venera a sacralidade da mãe-primordial, foi sempre pronto fulcral na perpetua demanda do Homem consciente do sentido da sua vida. Até porque, como acreditava o saudoso Rei Dom Fernando II, que na sua ancestral raiz dinástica de Saxe-Coburgo-Gotha, sabia que era ali que o Espírito se fundia com a matéria, reformatando a própria lógica dos padrões criacionais e dando-lhes a possibilidade de cair, experienciando assim as agruras que dão forma à própria vida.

A Mãe, figura basilar num Portugal que desde o seu início se define em torno da consagrada concepção de Maria, surge assim como o garante do resultado ascensional dos seus filhos. Como se de uma escola se tratasse, o calcorrear dos trilhos efémeros deste “vale de lágrimas” organiza-se nos ciclos reiteradamente assentes no binómio da dor e do prazer, sendo essencial que seja a Mãe a levantar os seus filhos quando eles acabam por se magoar, caindo ao longo do percurso que têm obrigatoriamente de completar inteiramente.




Qual Lei dos Contrastes, o bem e o mal debatem-se permanentemente e funcionam como motor que faz progredir o neófito na sua caminhada em direcção ao Pai. Até porque sem cair ninguém aprende a andar. E sem a noção experiencial da dor, do sofrimento e da angústia, não faria sentido algum a plenitude totalizante de um céu despojado das âncoras que sustentam o Ego.

Por isso é sagrado o papel da mãe. Dolorido e pejado de sofrimento, tanto maior quanto mais abarcante for o amplexo da responsabilidade que sempre surge associada ao conhecimento e ao crescimento. É a mãe que dá sentido à existência e, sendo ela própria a fornalha que conjuga as substâncias que permitem a vida, é também através dela que se melhor se expressa o caminho de regresso a casa, nem sempre fácil nem linear, antes marcado pelas vicissitudes necessárias ao crescimento daqueles que delas dependem.

Em Santa Eufémia de Sintra, como refere Vítor Manuel Adrião na sua “Sintra, Serra Sagrada”, as origens do culto a Santa Eufémia perdem-se nas origens do próprio tempo, estando relacionadas de forma directa com os cultos de fertilidade associados com a água, num apelo ancestral à Deusa-Mãe, Eufémia, origem simbólica de toda a ritualística Cristã da Senhora que concebe, ou seja, de Nossa Senhora da Conceição.

Ali, num enquadramento cénico que o romantismo novecentista reformatou, repetem-se as “aparições” marianas, associando-se a luz que delas emana aos milagres que através dela teimam em acontecer. A lenda que se confunde com a História deixa marcas nas pedras, aparentemente eternizando as provas de que é nesta sacralidade pura e primordial que está resguardado esse segredo maior que explica cada uma das nossas existências.

Classificado como Imóvel de Interesse Público desde 2002, o Alto de Santa Eufémia, em Sintra, carrega consigo 6000 anos de vidas que por ali se misturam numa plêiade milagrosa de histórias cujo significado profundo urge desvendar. Porque nesse seu apelo ancestral à importância da Mãe, está a resposta à única dúvida importante que a Humanidade pode formular…

sexta-feira

Scala Coeli – Um elevador para o céu no coração de Cascais



por João Aníbal Henriques

No coração do casco urbano de Cascais, junto à Igreja Paroquial e à Cidadela, está um dos edifícios mais extraordinários e enigmáticos da vila. O actual Centro Cultural de Cascais, que muitos conhecem ainda como as “Casas do Gandarinha”, foi inicialmente um convento oferecido por D. António de Castro, quarto Conde de Monsanto e Senhor de Cascais, e por sua mulher,  D.Inês Pimentel, à Ordem dos Carmelitas Descalços.

A cerimónia de colocação da primeira pedra, assim que foram firmados os termos da doação por parte dos Senhores de Cascais, aconteceu no dia 1 de Dezembro de 1594, depois de obtida a autorização papal e do arcebispado de Lisboa para esse efeito.

Mas não foi isento de problemas e de polémicas esse momento. Os militares sedeados na Fortaleza de Cascais, preocupados com a proximidade do futuro convento e com os projectos de ampliação da fortificação, tudo fizeram para embargar a obra. Mas não conseguiram e a inauguração aconteceu em 1641, logo após a restauração da independência nacional, quando ficou terminada a capela e o espaço de culto que lhe estava associado.

E no Convento de Cascais, com a sua matriz mariana e dedicado a Nossa Senhora da Piedade, logo se instalaram os primeiros religiosos que, para além do culto regular similar ao de outros espaços semelhantes existentes noutros locais, ali criaram aquela que vem a ser uma das primeiras escolas de filosofia de Portugal.



Hermética e sensível àqueles que eram os mistérios daquela época, a comunidade de Cascais enveredou por uma linha de pensamento desalinhada com os poderes vigentes e, num ímpeto de inovação espiritual, procurou conhecer os mistérios da vida e da morte, perpetuando correntes de pensamento quase heréticas que juntavam nomes como os de Raimundo Lúlio, Santa Teresa d’Ávila, Santa Isabel de Portugal, Alberto Magno ou São João da Cruz. A sua ciência, misturando os conhecimentos técnicos da época com os valores abstractos da Alquimia, ou seja, a “ciência de Maria”, produziam para o Mundo Profano a célebre “Água de Inglaterra”, que curava praticamente todos os males de que os cascalenses de então padeciam, e para os iniciados deixava as pistas que orientavam os frades na sua busca espiritual pelo Santo Graal, essa porta aberta para a verdadeira sabedoria. Os metais comuns transformar-se-iam em metais preciosos, da mesma forma que o espírito transcende a matéria alcançando a sacralidade superior e diluindo-se na própria essência de Deus.

As paredes velhas do antigo Convento de Nossa Senhora da Piedade, guardam ainda hoje esse segredo maior. E na memória perene de cada uma daquelas pedras, estão ainda as pistas que nos permitem perceber o alcance da Obra que dali se foi espalhando por toda a Terra. Assumindo-se como verdadeira Scala Coeli, o convento de Cascais era funcionalmente um elevador que transmutava as Almas mostrando-lhes o caminho que lhes permitia elevarem-se ao Céu.

Até porque o Ouro e as riquezas materiais, efémeras como é efémero o nosso conceito da linearidade do tempo, são substância de segunda importância quando comparadas com o manancial de vida que floresce do acto de transformar o pão que alimenta o corpo nas rosas que alimentam o espírito…

Por isso, onde hoje se promove a cultura e se constrói saber, viam os Carmelitas Descalços daquele tempo uma imensa escadaria que subiam pacientemente, um passo de cada vez, até chegarem ao Céu.



Nas escavações arqueológicas que a Associação Cultural de Cascais ali fez durante a década de 90 do século passado, sob a direcção de José d’Encarnação e Guilherme Cardoso, e que precederam as obras de remodelação das novecentistas Casas do Gandarinha para que fossem transformadas no actual Centro Cultural, foram trazidos à luz do dia os vestígios dessas outras vidas e desses outros tempos, num exercício catártico que fez Cascais recuar no tempo até à fatídica noite de 1 de Novembro de 1755 quando o grande terramoto destruiu de forma arrasadora aquele cadinho de saber.

Mas ainda hoje, passados mais de um quarto de século desde que o novo equipamento se abriu à curiosidade dos cascalenses, são poucos aqueles que possuem a chave encriptada que permite desvendar os segredos maiores que aquele Tabernáculo teimosamente continua a esconder.

Como se a vida e a morte, que os frades ali cantaram, fossem mesmo as partes complementares de casa Ser.

VEJA AQUI O FILME SOBRE A SCALA COELI DE CASCAIS:


quinta-feira

Regresso do Presidente da República a Cascais Após Viagem aos Açores em 1941



por João Aníbal Henriques

Em Julho e Agosto de 1941, num contexto internacional marcado pela II Guerra Mundial, a República Portuguesa teve necessidade de afirmar a importância do Arquipélago dos Açores para a soberania nacional. Para tal, cumprindo aquele que era um desiderato sempre adiado desde a viagem efectuada àquele território pelo Rei Dom Carlos e pela Rainha Dona Amélia, o então Chefe de Estado, o General Óscar Fragoso Carmona, fez uma visita oficial preparada com minúcia e muito cuidado e apoiada por uma campanha de comunicação nunca vista em Portugal.

Com o perigo eminente de um ataque alemão àquela que era estrategicamente uma das mais importantes rotas de fuga numa Europa em guerra, os Açores eram igualmente visitados pelos interesses particulares de ingleses e americanos que Portugal tinha de rebater, afirmando-se historicamente como o país proprietário daquele território ultramarino. A visita do General Carmona foi, deste modo, a forma encontrada para propagar junto de todo o Mundo a soberania portuguesa sobre os açores e, no contexto da guerra, reforçar a importância de Portugal enquanto parceiro estratégico das potencias beligerantes mesmo mantendo a sua bem conhecida neutralidade política.




Tendo corrido da melhor forma e cumprido integralmente os propósitos para os quais havia sido concebida, a visita do Presidente da República aos Açores fez manchetes em toda a comunicação social nacional e internacional, levando consigo a mensagem subliminar do Estado Português, e enchendo de orgulho e de esperança os portugueses que viam nos dirigentes do Estado Novo a solução mais pragmática para os muitos problemas que afectam cronicamente Portugal desde há demasiadas décadas.

Como no resto do País, Cascais vibrou de forma entusiasmada como os ecos desta viagem. E os cascalenses, cientes do facto de a sua vila ter sido escolhida pelo histórico presidente para sua residência oficial, impavam de orgulho perante o sucesso alcançado por aquele que eles consideravam um deles.

O mais entusiasmado dos cascalenses com o êxito da iniciativa foi José Florindo d’Oliveira, o dirigente de sempre da Propaganda de Cascais que, politicamente muito próximo dos ideais propagados pelo Estado, aproveitava todas as oportunidades para contribuir activamente para que a sua terra fizesse parte do grande plano de salvar Portugal. E nesta ocasião, mesmo contra as opiniões oficiais que pediam às entidades locais que se alheassem da viagem do Presidente da República aos Açores, Florindo d’Oliveira teimou em organizar a sociedade civil cascalense para receber de forma gloriosa o General Carmona no seu regresso à Cidadela de Cascais depois de tão retumbante êxito alcançado em terras açorianas.

Em conluio com o Presidente da Câmara Municipal de Cascais, José Roberto Raposo Pessoa, organizou uma festa de boas-vindas ao Chefe de Estado marcada de forma brilhante por um convite feito a todos os cascalenses que possuíssem automóveis, de forma a que se concentrassem à entrada do território municipal, junto à Fortaleza de São Julião da Barra, acompanhando em desfile a entrada do General Carmona em Cascais e acompanhando-o ao longo da Avenida Marginal, em cortejo embandeirado, até à residência oficial na Cidadela.




Dizia Florindo d’Oliveira num panfleto que encheu todas as caixas de correio do Concelho de Cascais: “Preparemo-nos para festivamente aguardar a chegada do Exmº. Senhor Presidente da República! Depois da triunfal visita aos Açores o Chefe da Nação tornou-se ainda mais querido aos nossos corações! A admiração que temos por Sua Excelência, o respeito que nos inspira o alto cargo, que tão elevadamente desempenha, aumentam com as manifestações de carinho, admiração e respeito que todos os nossos concidadãos lhe tributam. Recebamos grandiosamente, na volta ao seu lar nesta nossa vila, o Exmº. Senhor General Carmona e a Sua Exmª. Família! Regosijarmo-nos pela sua feliz viagem é abraçar também o Portugal Insular, pela nobreza com que recebeu o Chefe da Nação comum! Gritar bem alto que muito queremos ao preclaríssimo Chefe da Nação é dizer ao Mundo o nosso amor a Portugal!”




E o povo de Cascais respondeu à altura ao apelo de Florindo d’Oliveira e José Raposo Pessoa, literalmente entupindo a Avenida Marginal, entre a entrada por Carcavelos e a Cidadela de Cascais, com milhares de automóveis ostentando orgulhosamente centenas de bandeiras de Portugal, e acompanhados ao longo da estrada e enchendo os passeios, por milhares de Cascalenses que gritavam apoteoticamente pelo seu vizinho Presidente.

A reacção do Chefe de Estado não se fez esperar e no mesmo dia, através de telegrama enviado para a Câmara Municipal e para a Sociedade Propaganda de Cascais, o General Óscar Carmona agradece de forma sincera e reconhecida a iniciativa da Sociedade Propaganda, da Câmara Municipal, na pessoa do seu Presidente e dos Vereadores, e de todas as entidades públicas e privadas que contribuíram para a organização deste evento, sublinhando o quão importante havia sido para ele e para a sua esposa essa grande manifestação de carinho por parte dos cascalenses. Diz ele que foi “uma manifestação que lhe calou muito no seu espírito e que jamais esquecerá!”

Nas contas apresentadas no final do evento, verifica-se que o investimento dos cascalenses no mesmo ascendeu  a 602$50, a que se somaram cerca de 300$00 que foram pagos directamente pela Junta de Turismo de Cascais para impressão dos cerca de 10.000 convites distribuídos à população, e mais 600$00 relativos à oferta de foguetes e morteiros lançados durante a festa e que foram pagos pelo Grupo Desportivo Estoril Plage.


Fotografias do AHMC – Arquivo Histórico Municipal de Cascais

quarta-feira

O Louvor ao Trabalho do Campo na Aldeia de Murches em 1940



por João Aníbal Henriques

Em 1940, enquanto o Mundo se envolvia numa guerra de dimensões até essa altura inimagináveis, Portugal comemorava de forma sentida a grandeza da sua história através da alusão ao 800º centenário da Batalha de Ourique, em 1140, e o 3º centenário da Restauração da Independência Nacional, em 1 de Dezembro de 1640.

Pensada de forma a exaltar o passado glorioso do Império Português, e respondendo assim de forma indirecta às pressões das grandes potenciais internacionais que desejavam libertar as antigas colónias ultramarinas de forma a poderem controlar elas próprias as imensas riquezas que elas possuíam, este programa de comemorações assumia uma efectiva missão civilizadora, reforçando a identidade histórica do país e promovendo propagandisticamente o nacionalismo defendido pelo Estado Novo.




Cascais, desde sempre terra de Reis e de Pescadores, não se coibiu de apoiar e colaborar com a iniciativa, desde logo se empenhando numa série de iniciativas que compunham um programa comemorativo local e complementar às grandes eventos que estavam a ocorrer a nível Nacional. A sociedade civil cascalense, encabeçada pela Associação Comercial, pela Sociedade Musical, pela Associação de Bombeiros e pela Sociedade Propaganda, desenvolveu assim um conjunto inesperados de projectos nos quais participaram as entidades públicas de âmbito local e central.

Com o empenho muito particular de José Florindo de Oliveira, que na quantidade imensa de pedidos de apoio que endereça às mais variadas entidades públicas e privadas faz sempre questão de mencionar que os festejos de Cascais se inserem no vasto programa nacional comemorativo dos centenários, realizam-se em 1940, na aldeia de Murches, as festas de “Louvor ao Trabalho do Campo”. Explicando que com a inspiração que recebeu daquele que ela considera “o maior trabalhador de Portugal”, o Presidente do Conselho de Ministros, Doutor António d’Oliveira Salazar, pretende “ir ao encontro das necessidades e das dificuldades da boa gente do nosso campo, sem o ar ou o motivo e atitude de quem vai fazer uma esmola”, Florindo d’Oliveira  quer ajudar a comunidade agrícola que nessa altura ainda existia no Concelho de Cascais, e que tinha sido afectada por um péssimo ano agrícola que lhes havia condicionado de forma brutal os seus sempre muito precários rendimentos.

Diz ele que que ir “muito alegremente levar-lhes o conforto e o auxílio possível, tendo como protesto para tal fim uma festa de trabalho” com a apresentação de carros de lavoura, gados, alfaias, usos e costumes, de forma a evitar que os poucos que subsistem deixem de amanhar, cultivar e semear as poucas terras produtivas que subsistem em Cascais.




Para tal, escolheu a aldeia de Murches para receber este evento, não só porque tinha em seu torno um moinho e uma azenha, como porque tinha uma bem preservada capela dedicada a Santa Iria que lhe permitia juntar uma componente religiosa sempre muito importante para dignificar os festejos populares. Dizia ele, em correspondência trocada com o Secretariado de Propaganda Nacional, que queria aproveitar o cenário bucólico deste recanto campestre cascalense, para que a festa seja em tudo bem portuguesa, a bem da vivência das nossas aldeias e gritando de forma entusiasmada a parangona que serve de assinatura aos festejos nacionais: “Viva Portugal!”

Logo pela manhã, depois de um desfile etnográfico feito pelos alunos das escolas das aldeias vizinhas, todos os participantes reuniram-se junto à Capela de Santa Iria, em Murches, com as componentes da Mocidade Portuguesa que eram dirigidas pelo Comandante Joaquim Segurado. A solenidade dos festejos, sobretudo aqueles que contaram com a participação massiva da juventude de Cascais, foram primorosamente preparados de forma a impressionarem aqueles que a eles assistiram. Florindo d’Oliveira considerava que a solenidade ajudava a impressionar e a fixas no espírito os valores que presidiram à organização do certame e, desta maneira, a promover a mensagem que está subjacente ao próprio programa das comemorações.

A encerrar essa primeira manhã, uma salva de morteiros acentuou o carácter oficial da iniciativa, enquadrando a visita de honra à capela, onde a Mocidade de Portuguesa fez a guarda de honra ao altar, e que antecedeu a distribuição de prémios junto das crianças participantes. As meninas receberam um corte de vestido e um mapa de Portugal e os rapazes mais bem classificados receberam uma nota de vinte Escudos e o mesmo mapa de Portugal.

Os festejos religiosos seguiram-se presididos pelos priores de Alcabideche e de Cascais, e neles terão participado centenas de populares que ali acorreram oriundos das mais variadas paragens em torno de Lisboa.




A finalizar a festa e para regozijo de todos os participantes, realizou-se uma parada pecuária com enfoque nas especialidades equina, bovina, ovina e suína, que se dividiu ao longo das ruas que de diversas origens levavam ao adro da capela. Na primeira secção participaram garanhões de 3 a 10 anos de idade e cavalos castrados de 4 a 15 anos de idade. Na segunda secção estiveram éguas de criação e de trabalho. Na terceira secção brilharam juntas de bois mirandeses, conhecidos como “ratinhos” atrelados a carros ornamentados. Na quarta secção foi possível ver vacas taurinas e novilhas, que antecederam a quinta secção onde surgiam os rebanhos de ovinos compostos por ovelhas de raça burdaleira e saloia. Na última secção viam-se varrascos, com procos reprodutores de origem inglesa que se misturavam com porcos bízaros de origem local.

O júri que classificou os gados, os carros e as crianças que participaram nos festejos e que decidiu que prémios lhes ia entregar, era composto por Francisco Romano Esteves, Dr. Sousa Amado, Tenente Silva Reis, Dr. Alfredo Branco e Dr. António Sérgio Pessoa. A Comissão de Honra, em que participaram os grandes nomes das personalidades mais importantes de Cascais, como Armando Villar, António Muchaxo ou Abreu Nunes, era presidida pelo Capitão José Roberto Raposo Pessoa que nessa altura desempenhava funções como Presidente da Câmara Municipal de Cascais.

Integradas no programa extra-oficial do programa de Comemoração dos Centenário Nacionais, as Festas de Louvor ao Trabalho do Campo, em Cascais, destinavam-se a levar aos povos das aldeias cascalenses a ideia patriótica de uma Pátria enaltecida pelos feitos dos seus antepassados, apoiando assim os esforços que estavam a ser desenvolvidos em termos globais pelo Governo da Nação.

Fotografias do Arquivo Histórico Municipal de Cascais - AHMC


terça-feira

As Festas do Divino Espírito-Santo em Cascais


por João Aníbal Henriques

A ligação ancestral de Cascais à Igreja Católica, Apostólica e Romana existe desde tempos imemoriais. Logo em meados do primeiro século, quando os seguidores de Jesus abandonaram a designação de “Nazarenos” pela qual tinham ficado conhecidos, para assumirem a condição de Cristãos, que a palavra sagrada se espalhou rapidamente através da imensa rede de estradas que dava forma ao então Império Romano. E é crível, até porque a arqueologia nos oferece provas cabais da existência de redes comerciais entre o extremo Ocidental e a Cidade de Roma, que a nova doutrina tenha chegado depressa e sido estabelecida neste território.

Para além da Páscoa, numa extensão das práticas espirituais que vinham desde a época Judaica e que se adaptaram à nova religião que surgiu com a Morte e a Ressureição de Nosso Senhor Jesus Cristo, um dos momentos altos do calendário votivo entre os Cristãos era a comemoração do Pentecostes, ou seja, a celebração da descida do Espírito-Santo sobre os Apóstolos ao quinquagésimo dia após a Ressureição de Cristo.

Como refere João da Cruz Viegas num dos seus opúsculos sobre a História de Cascais, a “Páscoa do Espírito-Santo é festejada cinquenta dias depois da Páscoa Cristã e oito dias antes do Domingo da Santíssima Trindade, comemorando a descida do Espírito-Santo sobre os doze Discípulos de Cristo, pelas nove horas da manhã, quando estavam em oração com Maria Santíssima e outras santas mulheres no Cenáculo, casa situada no Monte Sião onde Jesus Cristo tinha celebrado a sua última Páscoa com os Apóstolos”.



De acordo com  as Sagradas Escrituras, o Espírito-Santo desceu sobre os doze Apóstolos como línguas de fogo, ganhando eles assim o dom de entender e falar vários idiomas simultaneamente, ganhando a graça de fazerem milagres e enchendo-se com a sensação avassaladora da imensa sabedoria que lhes foi entregue. Simbolicamente associado ao acontecimento, é a pomba branca que a Cristandade passou a utilizar para perpectuar na memória esta alteração paradigmática do rito fundacional daquela que haveria de se tornar na mais importante de todas as religiões professadas no Mundo durante dois mil anos.

Em Cascais, onde os primeiros templos Católicos acompanham a formação da própria nacionalidade, as festividades comemorativas do Pentecostes deverão ter existido pelo menos desde o Século XVI, quando no antigo Convento de Nossa Senhora da Piedade se instalou uma comunidade Carmelita que tinha no culto ao Espírito-Santo um dos seus pilares de Fé. Originalmente com um cunho muito simples, organizado em torno de um grupo de cascalenses que percorria as ruas da vila com uma bandeira evocativa da efeméride e que recolhia os donativos dos moradores para o pagamento das despesas com o “bodo” destinado a alimentar condignamente os habitantes mais pobres, depressa evoluíram para rituais mais elaborados, como o atestam em termos comparativos os festejos que ocorriam simultaneamente noutras partes do País e, aqui mesmo ao lado, na aldeia serrana do Penedo, em plena Serra de Sintra.

Nessa segunda fase, uma vez mais em continuidade com os velhos rituais ancestrais e provavelmente pagãos que eram concretizados nestas paragens desde a época Pré-Histórica, juntou-se aos festejos a figura de um boi que, muito enfeitado, percorria as ruas da vila de forma a mostrar aos desfavorecidos a qualidade da oferta que iriam receber.

Este ritual de partilha, concertada sobre uma espécie de pacto-social em que participavam os mais abastados habitantes locais, que dessa forma partilhavam com os menos afortunados a sua prosperidade no âmbito de um ritual religioso que esbatia a ideia de uma “caridadezinha” que muitas vezes inibia por vergonha os que verdadeiramente necessitavam dessa ajuda para sobreviver, garantia que todos tinham acesso à quantidade mínima de nutrientes que são necessários para preservar a saúde e o bem-estar da comunidade, nomeadamente das proteínas que raramente chegavam ao prato da maior parte dos cascalenses mais pobres.



Escolhendo para coroar como Imperador a crianças mais humilde, pura e pobre que encontrassem na terra, e que simbolicamente, devido aos seus predicados, se tornava naquelas festividades o cerne de toda a devoção dos cascalenses, a festa do Espírito-Santo terminava sempre com um jantar onde participavam as mais importantes personalidades locais, que pagavam integralmente a sua refeição e que, dessa maneira, se associavam ao ritual de viabilização do bodo dos pobres que seguidamente lhes era oferecido.  Muitas das senhoras de Cascais, num acto de abnegada devoção, adquiriam doses do bodo para elas próprias oferecerem aos mais pobres e guardavam consigo porções de pão benzido que utilizavam ao longo do ano para consagrar as efemérides mais relevantes.

João da Cruz Viegas, no opúsculo atrás referido, menciona os cascalenses ilustres que no jantar de 1903 se juntaram no antigo “Hotel Globo”, situada por cima da Mercearia Pedada, cumprindo este ritual que tão importante era para a Identidade da Nossa Terra: “Comendador Manuel Vieira d’Araújo Viana, que era o juiz da festa naquele ano; Dom Fernando Castelo Branco (Pombeiro), Administrador do Concelho; Rodrigo Luís Caldeira, Secretário da Câmara Municipal; Francisco da Silva Vedras; António Mendes Lopes, farmacêutico; João Desidério Nunes; João Campos; Alexandre Inácio; Domingos Vardasca; Júlio Ovidio Morgado; Domingos Teixeira dos Santos; e Manuel Pereira Dias”.

Este último, que ainda em vida passou a Cruz Viegas estas informações, explicou-lhe ainda que nesse ano de 1903 foram vinte e três os festeiros encarregues de fazer cumprir a tradição e que a despesa acumulada, que serviu de base à preparação do bodo popular, ascendeu a um total de 284$000 Reis.

Interrompidos provisoriamente depois da implantação do regime republicano, os Festejos do Espírito-Santo foram retomados em Cascais ao longo da década de 40 do Século XX por iniciativa de José Florindo de Oliveira e de Eugénio da Assunção que, como em quase tudo o que acontecia na vila durante aquela época, contaram com a entusiástica participação de Armando Penin Gomes Villar, então Presidente da Propaganda de Cascais e de Alberto Mourato que com ele assumiu a responsabilidade de pagar um boi para compor o bodo seco oferecido à população.



Nas Festas de 1943 o bodo foi servido aos pobres de Cascais nas instalações do antigo hospital anexo à sede da Santa Casa da Misericórdia, numa cerimónia que foi presidida pela Senhora Dona Maria do Carmo Fragoso Carmona, mulher do então Presidente da República, coadjuvada pela D. Albertina de Melo e por Dona Rosa de Melo. O juiz da festa desse ano, Guilherme Cardim, juntou-se ao bodo com o tesoureiro, Pedro Valentim Nava, que com as senhoras degustaram sopa, cozido à portuguesa e vinho, ao som da banda filarmónica do Grupo Desportivo Estoril-Plage. Nesse dia fez-se distribuição de carne ao hospital da Santa Casa da Misericórdia, à Casa dos Pobres, à Casa de Trabalho de Nossa Senhora da Assunção, à Maternidade Maria Amália Vaz de Carvalho, e do bodo molhado aos dois únicos presos que estavam encarcerados na cadeia da vila. Para as crianças que frequentavam a Creche José Luís foi entregue arroz e massa, sendo que por toda a vila foi distribuído larga quantidade de pão bento.

No jantar final, ocorrido no dia 13 de Junho, estiveram presentes Guilherme Cardim, Pedro Valentim Nava, João da Cruz Viegas, Padre Moysés da Silva, Joaquim Nunes Ereira, João António Gaspar, Francisco Avelino de Sousa Amado, Frederico da Costa Pinto, Joaquim Canas Jardim, Dom António Castelo Branco, Professor Francisco Cruz, Alberto Mourato, António Santa, Eugénio Bernardino d’Assunção, António Ricoca, Pedro Aguiar, Abílio Maria, Carlos de Sousa, Júlio Pedro d’Assunção, Manuel Paulino, António da Silva Neves Júnior, Sebastião Bonifácio, Osvaldo Faria, Ventura Ledesma Abrantes, João Victor Gaspar, José Afonso Vilar Júnior, Filipe Nobre de Figueiredo, Francisco Silva, Aníbal Contreiras, António Ferreira dos Santos, Miguel dos Reis, José Cartaxo, Silvino Duarte, José Apolinário Duarte, António Miguel Muchacho, Joaquim António Gaiteiro, Domingos Nunes, Serafim Nunes, Gabriel Muchacho, Fernando José Dias e João Marinha Arraia.

A partir do ano de 1944, por iniciativa de Armando Villar, os festejos passaram a incluir uma comissão de “Mordomos de Honra” que, contribuindo materialmente para a festa, evitavam que a mesma decorresse sem a dignidade que todos consideravam essencial para o sucesso do evento. Nessa primeira edição foram “Mordomos de Honra” o Reverendo Padre Moysés da Silva; o Presidente da Câmara Municipal, José Raposo Pessoa; o Presidente da Junta de Turismo, Augusto Teles Abreu Nunes; o Presidente da Junta de Freguesia, D. José Avilez; o Administrador da Estoril Plage, Guilherme Cardim; Joaquim Nunes Ereira, pela Propaganda de Cascais; e João da Cruz Viegas. Fizeram ainda parte as senhoras D. Felícia Gonçalves Villar, D. Felismina Canas Cardim, D. Lucinda da Silva Abreu Nunes, D. Laura Carnoto d’Oliveira, D. Maria José Magalhães Pessoa, D. Maria Isabel Avilez, D. Rosalina Pedroso Muchaxo e D. Tomásia Canas Ereira.



Na edição de 1948, com Ricardo Espírito-Santo Silva como juiz e José Afonso Villar jr. como tesoureiro, os festejos contaram com a presença e apoio de Gabriel Muchaxo, Joaquim Sabino Pedroso, Silvino Duarte, António Silvestre Gonçalves, Alfredo Luiz Paulo, Francisco Casaleiro, Conde Murça, Condessa de Monte Real, Casa de Palmela, D. Nuno Almada, Condessa de Azambuja, Conde Jorge de Monte Real,  Condessa de Linhares, D. Maria Inez Carmona, Conde das Alcáçovas, Conde de Cabral, José Ribeiro Espírito-Santo Silva, Eduardo Guedes de Sousa e Dona Amélia de Melo. À festa juntaram-se ainda Armando Villar (então Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Cascais), o médico Dr. Álvaro de Lacerda e Melo, Amadeu Stoffel, António Casimiro d’Almeida, António Muchaxo, Guilherme Cardim, José Teixeira Roxo e Manuel Paulino.

As Festas do Divino Espírito-Santo de Cascais são uma das mais antigas tradições desta vila de Reis e de Pescadores, traduzindo a um só tempo a vivência religiosa e social da terra e das suas gentes. Conhecê-las e compreendê-las, integrando-as na dinâmica própria de cada momento da História de Cascais, é um passo importante para ajudar a projectar o futuro dinâmico e coeso pelo qual todos ansiamos.

Fotografias do Arquivo Histórico Municipal de Cascais e do Arquivo Histórico da Sociedade Propaganda de Cascais


quinta-feira

Os Tronos de Santo António de Cascais em 1952



por João Aníbal Henriques

A ligação de Cascais a Santo António é ancestral. Já antes da instalação na Cidadela do regimento Dezanove de Infantaria, que tinha Santo António como orago, existia na Capela de Nossa Senhora da Vitória uma imagem do Santo Taumaturgo que haveria de ter um papel de decisiva importância na consolidação da Identidade Cascalense.

Em 1952, numa iniciativa conjunta da Sociedade Propaganda de Cascais e da Junta de Turismo do Estoril, foi realizado um muito popular concurso de tronos dedicados a Santo António que encheram as ruas de Cascais de cor e de movimento dando o mote para o clima de grande devoção que toda a vila dedicou ao santo lisboeta. Com imensa participação popular, e um júri que incluía os dirigentes da propaganda e do turismo e ainda elementos da direcção do Casino Estoril, a iniciativa passou por vários dos principais arruamentos da vila e teve prémios de valor considerável que foram dos 500$00 aos 50$00, distribuídos em quatro escalões consoante a avaliação efectuada pelos cascalenses.




Agraciado com o primeiro prémio foi a dupla formada pelos cascalenses José Luiz e António Jorge Rodrigues Cardoso, que receberam 500$00 pelo trono que montaram no nº 95 da Rua Visconde da Luz. Em segundo lugar ficaram Maria Matilde dos Santos Branco e Maria Luiza Brígida, moradoras na Rua dos Navegantes, nº 46, tendo recebido um prémio de 400$00. Em terceiro lugar, com um prémio de 200$00, ficou Guilherme Luiz Antunes da Conceição, com o seu trono montado na Rua Nova da Alfarrobeira, 9. O penúltimo premiado foi Maria Teresa Dâmaso de Jesus, moradora no número 11 da Rua Alexandre Herculano e tendo recebido 100$00. E o quinto premiado foi José Manuel Assis Santa, que recebeu 50$00 pelo trono que montou em sua casa no Beco Torto, nº 14.

A cerimónia de entrega dos prémios aconteceu no Casino Estoril no Domingo, dia 22 de Junho, tendo comparecido as mais altas individualidades da vida municipal, para além de uma comitiva representante dos comerciantes da baixa de Cascais.




Eurico Braga e Francisco Romano Esteves, em nome da organização, fizeram os discursos e entregaram os prémios, sublinhando sempre a importância destas iniciativas para o reforço da participação cívica dos cascalenses nos interesses da sua terra.

Depois de um interregno de várias décadas, a antiga tradição cascalense foi retomada em 1983, desta feita numa organização totalmente dirigida pela Sociedade Propaganda de Cascais e por iniciativa da dupla formada pelos directores António de Sousa Lara e Benjamim Quaresma Dinis, contando sempre com a presença, o entusiasmo e o apoio de Armando Penin Villar.




Nesse ano os festejos iniciaram-se com a procissão, que saiu da porta da Cidadela em direcção à Igreja de Nossa Senhora da Assunção, e que culminou, às 17h00, com a actuação da Orquestra Ligeira do Exército no palco do Largo Luís de Camões.

O êxito da iniciativa, bem patente nas notícias dadas pelo Jornal da Nossa Terra e pelo Jornal da Costa do Sol, contou ainda com o patrocínio da Câmara Municipal de Cascais e do C.I.A.A.C – Centro de Instrução de Artilharia Antiaérea de Cascais.




Fotografias AHMC - Arquivo Histórico Municipal de Cascais