por João Aníbal Henriques
Altaneiro no cimo da Serra de São
Luís, o Castelo de Palmela é, provavelmente, aquele que tem o melhor
enquadramento cenográfico natural de Portugal. Com vista privilegiada para o
Estuário do Sado, controlando as Serras da Arrábida e as terras de Tróia, o
castelo apresenta características típicas das várias épocas construtivas a que
foi sujeito.
A ocupação original do espaço,
provavelmente da época Neolítica, ainda em período Pré-Histórico, enquadra-se
na vivência mais comum deste tipo de construções, aproveitando a sua situação
estrategicamente relevante para, num laivo de recrudescimento de eventuais
posturas, se impor perante a envolvência e definir em seu turno uma vasta área
de paz e de prosperidade.
A ocupação deste local é, assim,
linear e contínua ao longo dos séculos, com focos permanentes de ocupação
humana que lhe foram conferindo, através das suas intervenções na paisagem, a
forma e as características que hoje apresenta.
Depois de Visigodos e de
Muçulmanos terem feito de Palmela uma povoação de destaque no contexto da
ocupação humana do território agora Português durante a Idade Média, foi na
época conturbada da reconquista que se definiram em definitivo as suas
dinâmicas de ocupação e de desenvolvimento.
Quando Dom Afonso Henriques, no
esforço de reconquista das Terras de Portugal, derruba Lisboa, em 1147, abriu
caminho para outras lutas e vitórias, que se estenderam, ainda na mesma data, a
Sintra, Alenquer e Palmela.
Mas foi sol de pouca dura… a sua
posição privilegiada na paisagem e a situação estratégica na defesa das
entradas por mar via Rio Sado, tornavam Palmela demasiado importante para que a
reconquista Cristã fosse facilmente concretizada e definitiva. Estratégias de
contra-ataque, numa tentativa permanente de recuperar esta peça tão importante
para a afirmação do poderio militar muçulmano, tornaram este castelo alvo de vários
episódios sangrentos de conquistas e reconquistas, passando sucessivamente de
mão para mão com evidentes prejuízos para a população e para a paz do local.
Depois de recuperada pelos Árabes, Palmela foi reconquistada e novamente
perdida pelas forças da Cristandade em 1158 e em 1165, data em que o Rei Dom
Sancho I, numa tentativa fugaz de condicionar o destino do local, entrega o
castelo à Ordem Militar de Santiago.
Mesmo assim, perante o poderio
inaudito do líder muçulmano Abu Yusuf Ya’qub al-Mansur, voltou a cair nas mãos
do inimigo e só em 1205 entrou em definitivo em mãos Cristãs.
Mas mesmo assim não foram de paz
permanente os tempos do Castelo de Palmela. Mesmo depois de estar
definitivamente integrada no Reino de Portugal, foi alvo de investidas e
ataques que a desfiguraram, gerando um clima de insegurança e de incerteza que
se prolongou pelos tempos. Em 1382, durante o reinado do Rei Dom Fernando, as
tropas Castelhanas saquearam a cidade o o seu castelo, produzindo um índice de
devastação que desfigurou de forma perene a estrutura defensiva daquele baluarte,
obrigando à realização de obras profundas com vista à sua recuperação e ao
reforço da sua capacidade de resistência às investidas dos inimigos, que lhe
confeririam o aspecto que hoje lhe conhecemos.
Em 1384, novamente no âmbito de
um cerco que punha em causa da sobrevivência do próprio Estado de Portugal, foi
dos torreões do Castelo de Palmela que Santo Condestável Dom Nun’Álvares
Pereira, o monge consagrado à devoção de Maria, avisou o Mestre de Aviz da
chegada dos Castelhanos, acendendo ali enormes fogueiras que foram vistas a
partir de Lisboa.
O Castelo de Palmela é, desta
forma, uma das peças mais interessantes do património militar Português. Não só
pelas características específicas que denotam a conturbação de quase dois mil
anos de uma história pouco fácil, mas também pela sua intervenção específica
nos destinos que a História reservou a Portugal.