sexta-feira

Aquilino Ribeiro: Deturpar Portugal




por: João Aníbal Henriques

De tempos a tempos, e em áreas completamente díspares, Portugal é abalado por acontecimentos que, pela sua importância, se tornam decisivos para o futuro do País.

Contrariamente ao que seria de esperar, muitos desses acontecimentos acabam por não possuir o envolvimento mediático que lhes conferiria a notoriedade pública que merecem, passando despercebidos aos cidadãos menos atentos, e relegando para uma pseudo-elite culturalmente exigente as discussões em torno das repercussões dessa situação no devir Nacional.

Foi exactamente isto que se passou recentemente em Portugal. O escritor Aquilino Ribeiro, quarenta e quatro anos após a sua morte, foi transladado para o Panteão Nacional com o apoio unânime a aclamação de todos os Deputados da Assembleia da República.

O gesto, envolto na pompa e na circunstância que lhes foram conferidas pela presença do Presidente da República e por algumas das mais altas instâncias da Nação, representa um choque profundo para a Portugalidade, possuindo repercussões graves na essência quase mística que envolve o dia-a-dia de Portugal.

Reconhecido de forma unânime como um dos grandes vultos literários e culturais do Portugal do Século XX, com uma obra profusa e de enorme (e inquestionável) qualidade, Aquilino Ribeiro foi paralelamente um activista político, com posições muito próprias e atitudes condizentes. Foram essas actividades que nortearam a sua vida, determinando de forma efectiva aquilo que foi a sua relação social com os outros e com o País. Quer queiramos ou não; quer gostemos ou não; quer partilhemos ou não com Aquilino as suas opiniões, posições e formas de intervenção, há qualquer coisa que é inultrapassável e que marca a diferença nas apreciações que dele possamos fazer: assumiu sempre aquilo que foi e aquilo em que acreditava.

A cerimónia de transladação de Aquilino Ribeiro foi, no entanto, um acto de profundo desrespeito por ele, pela sua vida e pelas suas posições, sendo que, no plano oposto, foi também um momento que não dignificou as causas dos que se opuseram a este acto.

De um lado, os políticos e intervencionistas ditos de esquerda, apoiantes da homenagem, que teceram comentários jocosos àqueles que levantaram dúvidas sobre a legitimidade do acontecimento. Do outro, um conjunto de personalidades ditas de direita (na comunicação social tidas erradamente como monárquicos), que inventaram contra o escritor, tentando aniquilar a sua obra à sombra da mancha que paira sobre o seu desempenho político.

Com estas atitudes, posições e opiniões todos erraram. Uns, porque anulam o político intervencionista que Aquilino sempre foi e assumiu, dando ênfase exclusivamente à sua componente de escritor e de homem de letras; outros, porque fizeram exactamente o contrário. Anularam a genialidade cultural do escritor, e tornaram-no unicamente no assassino do Rei Dom Carlos e do Príncipe Dom Luís Filipe.

Ambos erraram porque nos dois campos distintos, o político e o cultural, Aquilino foi sempre aquilo que foi, tendo assumido os seus actos, ideias e obra, agindo em conformidade com isso. Não se considerava um génio, e sabia ter cometido actos em nome dos seus ideais que contrariam os princípios mais básicos da dignidade Humana.

Passando aos factos: Aquilino é, inquestionavelmente, uma referência incontornável da culturalidade Portuguesa do Século passado. Só quem nunca leu a sua obra, e quem nunca se deliciou com a forma rebuscada como utilizava a língua Portuguesa, sublimando a sua faceta mais erudita e complementando tudo isso com os trejeitos avoengos de outrora, pode não aceitar esta premissa.

Por outro lado, e na sua vertente política, Aquilina foi também um intervencionista extremista, membro activo da carbonários e defensor de ideais neo-anarquistas que o colocaram em situações dramáticas em determinados momentos da sua vida. Foi o próprio Aquilino Ribeiro quem, pelo seu próprio punho, assume que participou directamente no assassinato do Rei. É ele próprio quem diz que ninguém viu ou soube mas que ele estava lá, sendo directamente responsável pelo acto atroz e por tudo aquilo que ele representa.

Aquilino colaborou e participou directamente na morte do Rei. E a razão para tal, presente de forma transversal em toda a sua obra, foi simples e linear: não gostava daquele homem e não se identificada com o regime político que ele representava. Por isso, e sabendo de antemão que não existir nenhuma outra forma de o derrotar, matou-o.

Do alto da sua verticalidade, e contrariando os que agora o dizem defender, jamais negou a situação, não tendo tentado adaptar a História às novas necessidades e realidades entretanto surgidas. Aquilino assumiu aquilo que fez, e se esse erro macula a sua vida numa perspectiva moral, nada lhe retira em termos do génio literário que foi.

Mas em termos práticos, há factos que a passagem dos anos não conseguem alterar. Aquilino Ribeiro matou; colaborou com uma organização terrorista; e participou em actos ignóbeis que colocaram em causa a liberdade de expressão e até de existência de outros Seres Humanos.

A vida Humana é intocável e sagrada. Como todos os abemos. E sem entrar nas discussões monárquico-republicanas que envolveram este acontecimento, ninguém que mata outrem pode ser homenageado Nacionalmente como heróis.

Os Deputados que apoiaram a transladação e a homenagem; o Presidente da República que teceu rasgados elogios ao escritor fingindo esquecer tudo o resto; o Primeiro-Ministro que se associou à cerimónia; o Presidente da Assembleia da República que foi a cara de todo o processo; e todas as demais entidades e personalidades que estiveram presentes; deveriam responder a algumas perguntas simples para elucidar os Portugueses: Apoiam Aquilino? Apoiam o terrorismo político? A chacina? A morte de alguém?

Se não, porque não uma homenagem ao Aquilino homem de letras, numa qualquer praça Portuguesa? Uma estátua, um ciclo de conferências, um livro com memórias!... Nunca o Panteão Nacional onde se colocam aqueles que ascendem à categoria de heróis.

A transladação de Aquilino Ribeiro para o Panteão Nacional é ignóbil por isto: um regime dito democrático não pode vacilar perante o terrorismo; perante o ataque á liberdade; perante o radicalismo; perante a intolerância… Não pode ser convivente com os extremismos e com a violência.

Em homenagem ao aquilino vertical, que foi grande nas letras e nas suas crenças, e que assumiu tudo o que fez, deveríamos retirá-lo do Panteão Nacional. Porque lá, tratando-o como o herói que não foi, se contrariam e deturpam os ideais de tolerância, ecumenismo, e diálogo que sempre caracterizaram o Homem Português.


quarta-feira

Viver no Shopping






por: João Aníbal Henriques


As grandes áreas comerciais, situadas geralmente nos subúrbios das maiores metrópoles, são um atractivo cada vez maior para a generalidade dos Portugueses. Nos dias de descanso, quando a lógica parece deixar supor que o tempo livre se deveria gastar no remanso do lar, ou aproveitando a oportunidade concedida pelos afazeres para desfrutar da natureza, os Portugueses dirigem-se em massa e apressadamente para as enormes filas de espera nos estacionamentos dos shoppings, gastando ali, de forma literal, todo o produto do seu trabalho e os poucos minutos que a vida lhes confere.

Cá fora, aqueles que para lá não vão, criticam esse hábito… porque não é saudável; porque é piroso; porque deixa transparecer a falta de consciência cívica e de preparação cultural do povo Português… Nada existe de mais errado.

Os shoppings estão cheios durante o fim-de-semana, porque pura e simplesmente respondem de forma eficaz aos principais anseios e necessidades dos Portugueses. São espaços bem planeados, com luz adequada, cores atractivas temperaturas ideais, e garantias de segurança que não se podem encontrar nos espaços públicos tradicionais. Por outro lado, conjugam todos estes benefícios com os espaços generosamente amplos, com animação, conforto e o entretenimento infantil que se vem tornando cada vez mais raros nas nossas cidades. Simultaneamente, e cumprindo o seu principal objectivo, tem para vender os bens que a sociedade, com as suas modas, usos e costumes, vai impondo aos cidadãos, criando um ciclo eficaz em que quem compra naquelas lojas está a pagar o produto, acrescido do valor necessário para manter as características agradáveis e atractivas do espaço envolvente.

Para quem vive nos minúsculos apartamentos que se constroem nos subúrbios das nossas cidades, onde os escassos metros quadrados são partilhados de forma pouco saudável, a dimensão dos shoppings representa a largueza que tudo pode conter. É um espaço confortável, agradável e atractivo onde apetece estar e ficar, e que contrasta largamente com as deficientes condições das habitações, rodeadas normalmente por espaços verdes onde a erva e o lixo proliferam, e nas quais os problemas de segurança e criminalidade são mais do que evidentes.

Contrariando aquilo que vai acontecendo por essa Europa fora, as cidades Portuguesas e os seus centros históricos são cada vez mais incapazes de atrair visitantes. É que, apesar do investimento que se tem vindo a fazer em mobiliário urbano, reordenamento, embelezamento, etc., todos os projectos são parciais, tornando num fracasso rotundo e sem consequências sociais os esforços que as Autarquias vão fazendo.

A questão mais premente que agora se deveria colocar, quando se tornam evidentes os malefícios sociais do sobre-endividamente das famílias e da falta que o espaço natural faz no equilíbrio da saúde humana, é a de se saber porque razão escolhem as famílias o shopping em detrimento dos centros históricos das nossas bonitas cidades.

E a resposta, em oposição àquela que explica o sucesso das grandes superfícies comerciais, é a de que as cidades, com o comércio dito tradicional e o espaço urbano desconfortável e inseguro, são incapazes de se reformular à luz dos novos tempos.

Para remodelar a cidades é necessário dinheiro, assumido aqui como sinónimo de investimento. Esse, como é evidente tem de vir de quem rentabiliza a sua presença na cidade, ou seja, dos (ditos) pequenos comerciantes. Como acontece nos shoppings, onde os lojistas obrigatoriamente têm de investir nas zonas comuns do empreendimento onde estão estabelecidos, os comerciantes tradicionais têm de assumir a responsabilidade de intervir nas condições do espaço público envolvente, criando as condições necessárias à captação de novos visitantes. É deles a responsabilidade de criar estacionamento; é deles a obrigação de garantir a segurança; é deles que depende a animação pública; será para eles também o conjunto de benefícios que resultarão da revitalização do espaço onde estão instalados.

Mas em Portugal, num rol de queixumes e de lamentos, são os comerciantes tradicionais os primeiros a mostrar a sua incapacidade de adaptação e evolução, remetendo para o poder público e para os políticos a resolução dos problemas que são seus.

Quem é que passeia no centro de uma cidade na qual o trânsito é caótico, onde não existe estacionamento, e na qual as lojas (desinteressantes e caras) oferecem produtos que não são aqueles que procuramos? Quem se pode dar ao luxo de perder horas numa cidade, calcorreando vários quilómetros à procura dos sapatos ideais se para tal bastam cinco minutos no shopping mais perto? Passará pela cabeça de alguém abandonar o seu trabalho a meio do dia para ir ao centro da cidade fazer compras unicamente porque as lojas fecham às sete?

A requalificação das cidades, essencial e imprescindível para permitir uma intervenção eficaz junto da desagregada sociedade Portuguesa, passa obrigatoriamente por uma revolução séria no espaço urbano. E essa, para se concretizar, tem de ser efectuada de forma profissional, consistente e congruente, envolvendo empenhadamente todos os principais intervenientes.

Com o poder político de lado, a interagir meramente como parceiro que deve ser, e cumprindo as obrigações que o actual sistema lhe confere, o comércio tradicional (ou de rua) tem de ser capaz de se reinventar, preparando um futuro a médio e a longo prazo e entendendo que de outra forma vai pura e simplesmente desaparecer.

Não vale a pena criticar as peúgas brancas; o galhardete do Benfica no pára-brisas; a música pimba; a discussão no estacionamento; e o relato da partida do dia partilhado em altos berros no rádio a pilhas. Não vale a pena gastar dinheiro em estudos e em projectos que indiquem às Câmaras Municipais quais são as medidas de animação e as obras que devem fazer nos centros históricos das cidades Portuguesas.

Nada disso terá resultados se o comércio tradicional não for capaz de anular as premissas sobre as quais vive actualmente, suicidando-se virtualmente, para que depois possa renascer eivado de uma nova dinâmica, competência e empenho.

No momento histórico que actualmente atravessas restam duas alternativas ao comércio tradicional Português: assumir o seu papel, cumprindo o que atrás se descreve; ou aguardar pacientemente durante mais algum tempo e obrigatoriamente perecer.

Sabemos que, no caso de a segunda opção se concretizar, os malefícios que isso trará para Portugal serão terríveis e quase impossíveis de inverter.

segunda-feira

Os Direitos de Portugal





por: João Aníbal Henriques

Mesmo através de uma análise superficial àquilo que a comunicação social tem vindo a escrever ao longo dos últimos tempos, é fácil perceber que uma espécie de histeria colectiva se apoderou de Portugal.

Contrariando aquilo que foram, desde sempre, os princípios norteadores da nacionalidade, uma onde incontrolável de vozes apelas, diária e constantemente, pelos inquestionáveis direitos dos portugueses. É o direito à saúde; o direito à justiça; o direito à segurança social; o direito ao trabalho; o direito ao aborto; o direito ao fumo; etc. etc. etc.

Tudo é considerado um direito, e todos os direitos são considerados essenciais e inquestionáveis, sendo o Estado (também ele de direito) obrigado a garantir, independentemente das condições do País, da conjuntura em que estamos envolvidos, do momento histórico que atravessamos, e até da comunidade (e ou comunidades) de que fazemos parte.

E tudo isto deveria ser natural e justo, pois a geração que actualmente nos governa, totalmente chamuscada pelos vapores revolucionários de Abril, comprometeu-se a si própria e ao país face a essa amálgama de valores de carácter sovietizante que a obrigam a manter esta situação.

Mas a grande questão é que nada disto é justo ou natural. Os ditos direitos que o comunismo soviético concebeu, principalmente aqueles que nascem de momentos de clivagem e corte abrupto como são as revoluções, mais não são do que tiradas propagandísticas inócuas e vazias de conteúdo que, para além de inconcretizáveis, subvertem os valores tradicionais das comunidades, comprometendo os interesses das Nações e os valores individuais, em prol de um comunitarismo que gera a irresponsabilidade e o medianismo.

Os direitos de que hoje se fala tanto, e que os nossos governantes, comentadores e políticos consideram primários e inquestionáveis, são verdadeiras fraudes que a maioria no poder impõe a todos e a cada um de nós. Esses direitos, gerais, genéricos e despersonalizados, nada valem quando separados do conjunto de obrigações e de responsabilidades individuais que, promovendo a integração de cada um no todo comunitário, geram as regras, os usos e os costumes gerais (as tais que o direito teórico apelida de consuetudinários), que estabelecem as regras que determinam os princípios e valores de uma determinada sociedade.

Fala-se hoje constantemente de direitos, e esquece-se, como se nenhuma importância tivessem, as palavras sábias de quem apela à responsabilidade; unem-se vozes para em uníssono virem exigir que o Estado garanta este e aquele direito, sem se perceber que esse mesmo Estado, essa entidade fugaz que geralmente se confunde com o governo, mais não é do que o resultado da soma aritmética de cada cidadão, amparado pelos princípios e valores que comunitariamente todos nós defendemos.

Fala-se hoje muito de muitos direitos que todos entendemos serem impossíveis de pôr em causa. Mas esquecem-se que todos eles possuem um custo, e que se pagam através das responsabilidades individuais e das obrigações de cada um, sem as quais não faz sentido defende-los ou torná-los efectivos.

Direitos sem obrigações, e estas sem responsabilidade, são sinónimos do completo caos político em que actualmente nos encontramos.

É que, como todos sabemos, não há almoços grátis, e quem ainda não o percebeu, está condenado a perecer.

sexta-feira

O Dalai Lama e a Vergonha de Portugal






por: João Aníbal Henriques

A tradição popular, desde sempre entendida como sinónimo de uma profunda sabedoria que retira das brumas do insondável as informações de que necessitamos para compreender o que nos rodeia, diz linearmente que o tempo tudo cura.

O passar dos anos; as vicissitudes do devir história; e a própria passagem inexorável das calendas; são sinónimo de reajustamentos sociais, económicos, políticos, ideológicos e culturais que representam o lento e natural processo evolutivo das comunidades e das sociedades humanas.

Contrariando tudo isso, e mostrando que o nosso País é mesmo uma realidade à parte do resto da humanidade, Portugal mostrou esta semana que por cá nada é linear nem evolui de forma natural.

Quando em 2001 recebemos a visita ilustre do Dalai Lama, chefe religioso e líder de uma comunidade que foi invadida e cerceada dos seus direitos fundamentais por um regime totalitário de raiz comunista, anti-democrático e eivado do mais profundo desprezo pela vida humana, o Estado Português recusou-se a assumir e a defender as suas posições e, pondo em causa todas as máximas ideológicas que serviram de pano de fundo à (sabe-se agora muito bem) abrilesca revolução dos cravos, foi incapaz de receber oficialmente este alto dignitário, com medo de com esse acto poder ferir susceptibilidades num regime que (agora também se sabe bem) as instâncias democráticas que lhe dão sustento apoiam de forma veemente.

Portugal não evoluiu entre 2001 e 2007. Nestes últimos seis anos, e depois das rocambolescas alterações partidárias que se sucederam no aparelho do Estado, verifica-se que tudo ficou na mesma.

Com um incomensurável apoio popular, bem visível nas expressões de carinho que têm vindo a público sobre a figura do Dalai Lama nestas últimas semanas, e pela completa enchente no Pavilhão Atlântico para assistir à conferência pública do próximo fim-de-semana, o líder religioso volta a Portugal sem ser recebido oficialmente pelos mais importantes representantes do Estado. Do Governo ao Presidente da República, passando por toda a longa cadeia de subalternidades que dão pompa e circunstância ao folclore do Estado, foi geral a falta de coragem, capacidade de entendimento, a falta de princípios e de valores que caracterizaram o Portugal dito oficial.

Mas a coisa poderia ficar por aqui. Ninguém o recebe; ninguém é capaz de assumir as razões efectivas que sustentam essa decisão; e todos nós ficávamos a saber com precisão que o Estado Português apoia, oficial e publicamente, a forma de estar, o sustento ideológico e a prática do Governo Chinês. Seria um direito que assistia aos actuais representantes de Portugal…

Mas não. Contrariando todos os restantes, e criando uma situação de absurda confusão, o Presidente da Assembleia da República recebeu oficialmente o Dalai Lama, sem qualquer espécie de reprimenda ou comentário dos seus pares, deixando o cidadão comum sem nada perceber.

Então o Estado Português apoia o Dalai Lama e as suas pretensões condenando a China, as suas posições, e a anexação forçada do Tibete? Se sim, porque motivo não foi o líder Tibetano recebido pelos restantes órgãos de soberania? Ou será que o Estado português não apoia o Dalai Lama nem o povo Tibetano, apoiando por exclusão de partes o regime totalitário comunista chinês, mas não teve coragem para o dizer publicamente quando Jaime Gama tomou a iniciativa de o receber?

Em qualquer dos casos, percebe-se uma coisa que não pode deixar de ser importante para os Portugueses: O Estado português, seja qual for a sua posição (e os recentes acontecimentos mostraram que ninguém sabe efectivamente qual é), não tem coragem para a assumir frontalmente.

E isso, tal como em 2001, continua a ser uma vergonha para Portugal e para os Portugueses!

quinta-feira

Nogueira Pinto e o Alívio da Madeira




por: João Aníbal Henriques

Alberto João Jardim, num acto de coragem, seriedade e grande consciência relativamente à realidade (leia-se também vontade) do povo que governa, utilizou as instâncias que a Lei prevê para criar soluções que lhe permitam cumprir a Lei da República.

Do Continente, que cada dia que passa se vai afastando cada vez mais daqueles outros portugueses, vieram de imediato os gritos da discórdia e da revolta. Dizia-se que Jardim não é democrata (quando o não ao aborto ganhou na Madeira); dizia-se que a sua decisão é ilegal (quando ele apelou às instâncias Nacionais para saber o que fazer com a solução disparatada que lhe impuseram); dizia-se ainda que a sua atitude é um desrespeito pela república, por Portugal e pela unidade Nacional (quando num anterior referendo Portugal votou contra o aborto facto que foi desrespeitado agora através de um novo plebiscito).

A favor de Alberto João Jardim, e para além da maioria dos Madeirenses, poucos ousaram opinar. E mesmo os que o fizeram, eivados da necessidade de ir lá buscar apoios ou votos de que vão necessitar avidamente dentro em breve, foram cuidadosos, não se comprometendo de forma empenhada como se sentissem vergonha ou embaraço de o fazer.

De facto, e analisando friamente a situação, sem que as posições a favor da vida ou a favor do aborto venham agora desvirtuar a perspectiva em relação à realidade, facilmente percebemos que a Lei aprovada pela Assembleia da República, que o presidente da dita rapidamente promulgou, e apesar de expressar de forma evidente o resultado oficial do referido referendo, é perfeitamente inconcebível no quadro do SNS que temos.

Quando alguém com cancro, doença crónica ou qualquer outra maleita a necessitar de cuidados urgentes para poder sobreviver, se depara com meses de espera para uma consulta e, por vezes, mesmo anos de demora numa operação que a gravidade do seu estado já não lhe permite fazer, como pode a república gastar esforços, meios humanos ou técnicos, e dinheiro, para fazer abortos a pedido de quem alegremente se entreteve a conceber o bebé?

Alberto João Jardim (e sublinho aqui o apoio expresso e explícito do povo madeirense) teve a lucidez, a coragem e o discernimento para dizer aquilo que deveria ser dito por todos os responsáveis por este País: não posso cumprir a Lei. Enquanto não existirem condições para isso, não é possível fazer. Ponto final!

Maria José Nogueira Pinto, num artigo digno de aplauso, vem hoje a público com um brilhante apontamento de opinião no Diário de Notícias. Naquele lugar, e com a visibilidade que sabe que agora tem, põe corajosamente no papel, de forma explicada e linearmente correcta, as razões que presidiram à decisão madeirense. Com as suas palavras, sem a grandiloquência de Jardim, e com a correcção, boa educação e rigor que todos lhe reconhecemos, explica comprovadamente a quem a queira ler, quais são as razões que dão razão ao líder madeirense.

Agora, com a coragem de Jardim, a ponderação de Nogueira Pinto, e com um vastíssimo apoio que lhe foi conferido pelo povo da Madeira, parecem já não existir razões para no continente não se perceber a situação. Agora, só não percebe quem não quiser.

Que alívio saber que ainda há quem fale Português…

quarta-feira

Liberdade de Educação



por: João Aníbal Henriques



Em 18 de Agosto próximo, quando o calor do estio começa a dar sinais de abrandamento e a brisa fresca do Outono se aproxima, fará 6 anos a minha filha mais velha.

Esta idade é, pelo menos desde o princípio do Século XX, uma marca consistente no percurso de vida dos portugueses. Marca o fim da despreocupação pré-escolar, com os jogos e brincadeiras envoltos somente em cheiros, cores e sabores, e simultaneamente a entrada na escola, para um percurso formativo que se adivinha longo, complexo e, nos dias que correm, com consequências perenes para o resto da vida.

Contrariamente àquilo que se podia esperar (pelo menos por parte daqueles que se deram ao trabalho de ler e reler os conteúdos programáticos dos actuais partidos políticos portugueses) o advento da dita democracia trouxe pouco de novo à educação em Portugal. Às críticas expressas relativamente ao passado, ao carácter opressivo da escola e do sistema educativo, e à falta de liberdade de escolha na instrução, o 25 de Abril respondeu com escolas liberais e proficientes, assentes na necessidade de oferecer à tecnologia um papel de destaque, plenas de liberdades e garantias para professores, pais e alunos.

Mas tudo isto foi (pelo menos até aos dias de hoje) pouco mais do que propaganda eleitoralística, que poucas (ou nenhumas) consequências práticas teve na realidade educativa Portuguesa.

Trinta e três anos depois da revolução, e com uma consciência acrescida relativamente à importância que tal facto tem na vida dos nossos filhos, os pais continuam coarctados e desprovidos de reais possibilidade de gerir o percurso educativo dos seus educandos.

Em Setembro próximo, já com ares de senhora e uma natural propensão para tudo aquilo que tem a haver com as estórias contadas e as letras que lhes dão forma, minha filha terá o seu primeiro dia de escola. Essa ocasião, marcante de forma efectiva na sua memória de vida, vai acontecer numa escola privada, escolhida pelos pais, onde estes encontram os programas, os princípios, as dinâmicas e a doutrina que consideram mais adequadas ao percurso instrutivo que a sua filha deverá seguir.

No entanto, e para que isso aconteça, nós pais, teremos de pagar duas vezes pela educação da nossa filha!... Sem apelo; sem agravo; sem possibilidade de interpor recurso para quem quer que seja; e assumindo que o esforço que faremos para garantir o cumprimento dessa duplicação de custos se fica a dever a especificidades efectivas que a criança tem, e que a obrigam a frequentar um determinado contexto escolar.

Através dos impostos, que nos são cobrados automaticamente no final de cada mês, o Estado paga a educação “tendencialmente gratuita” que a res-pública nos garante através da Constituição. Mas esquece-se (o Estado, o Governo, os partidos políticos, a comunicação social e os próprios pais), que essa parcela paga por todos para a educação dos nossos filhos tem um valor efectivo e real. Contabilizável e contabilizado. Ou seja, é possível saber exactamente quanto cada um de nós paga efectivamente em cada mês para a educação dos seus filhos.

Esse valor, sabe-se também nos dias que correm, que é substancial. Sabe-se que, quando comparado com os valores ditos irrealistas cobrados pelos estabelecimentos de ensino privados (considerados elitistas por parte de muitos), são efectivamente muito semelhantes. Sabe-se ainda que, se me fosse permitido gerir esse valor, escolhendo livremente a escola na qual desejo inscrever os meus filhos, tal resultaria em vários benefícios efectivos para todos:

1. A minha filha frequentaria a escola mais adequada ao seu perfil, significando isso à priori maior empenhamento e interesse e, por consequência, melhores resultados;
2. O Estado pouparia os custos referentes à frequência escolar da minha filha que, mesmo não frequentando a escola “da área de residência”, acaba por obrigá-lo a custear o lugar que lhe reservou;
3. As escolas obrigar-se-iam a um processo empenhado de qualificação dos seus recursos, estratégias e procedimentos (sob pena de não terem pura e simplesmente alunos e de com isso perderem os seus subsídios de funcionamento), com evidentes benefícios para toda a comunidade;

Conclusão: com o actual sistema dito democrático, e o autoritarismo esclerosado que vigora no nosso sistema educativo, a liberdade de escolha da escola, do percurso educativo dos nossos filhos, e das soluções que nós, pais, sabemos serem melhores para salvaguardar a qualidade da instrução recebida pelos educandos pelos quais somos responsáveis, pura e simplesmente não existem.

Vivemos sujeitos à ditadura da “escola na área de residência”; à ditadura de pagarmos por algo que não queremos ter; à ditadura de sermos obrigados a aceitar as imposições do Estado.

Dir-nos-ão os democratas dos partidos que nada disto é verdade; que a prova de que somos livres nessas escolhas está no facto de a nossa filha estar inscrita num colégio privado; de que qualquer um pode optar por soluções diferentes.

Mas aí, contrariando efectivamente os tais valores que os defensores de Abril dizem ser fundamentais, voltamos novamente ao mesmo. Só alguns, com capacidade, vontade e/ou discernimento para isso, o poderão fazer. Só alguns, com a consciência necessária para colocar os interesses do futuro dos filhos acima dos constrangimentos difíceis do dia-a-dia, se sujeitarão às regras do sistema em benefício de terceiros. Só alguns (talvez porque a democracia não é para todos) podem usufruir de um sistema educativo eficaz, adequado e com as garantias que todos desejamos para o percurso escolar dos nossos filhos.

Em Setembro próximo, pela 33ª vez de 1974, milhares de crianças Portuguesas vão usufruir do seu primeiro dia de escola. Mas a escola onde entrarão, a tal “escola da área de residência”, pode não ser necessariamente a que melhor se adequa ao seu perfil.

A escola onde vão entrar, e que recordarão toda a vida, será aquela que vão abandonar, muitas vezes antes de terminada a escolaridade obrigatória, porque ninguém lhes concedeu aquilo que a Constituição a todos nos promete:

Liberdade de escolha!

quinta-feira

Sócrates Inadmissível




por: João Aníbal Henriques




Com o enlevo que resulta das modernas técnicas de marketing político, preparando ao milímetro todos os tiques, gestos e posições assumidas pelo político no decurso de uma entrevista televisiva de grande visibilidade e impacto, José Sócrates foi à SIC descrever a paisagem do seu Portugal.


O cenário traçado, com perguntas brandas que os jornalistas lhe colocaram, foi pouco mais do que idílico. Um Portugal consistente; preparado para os desafios que enfrenta; e sobretudo ciente de que a crise que coloca em causa a qualidade de vida dos portugueses, para além de ter resultado das más escolhas dos governos anteriores, está a ser eficazmente resolvida pelo actual executivo.


De acordo com as palavras do primeiro-ministro, a educação promete vir a ter um dos futuros mais risonhos desde o início do Século XX; a saúde caminha para um estado em que nenhum português de debaterá com qualquer espécie de problema; a segurança social e a sua virtual falência será ultrapassada dentro de pouco tempo por medidas concretas (cuja descrição se escusou a fazer); e a justiça vislumbra já, pela primeira vez em muitos anos, uma situação de desafogo que garantirá que os processos deixam de se acumular nas mesas do juízes e em que todos os cidadãos poderão contar com uma resposta célere por parte dos tribunais.


Este cenário maravilhoso, que os jornalistas da SIC não questionaram mas que é colocada em causa pelo dia-a-dia dos portugueses, contrasta de forma evidente com o País Real. Portugal pode quase dizer-se que tem um sistema de justiça que não funciona; um sistema de saúde onde o conjunto de problemas de que enforma acaba por obrigar os nossos melhores médicos e técnicos de saúde a procurar no privado condições de trabalho que lhes permitam desempenhar cabalmente as suas funções; um sistema de segurança social onde o caos está instalado e no qual só medidas demagógicas e populistas vão permitindo o adiar final da crise; e um sistema educativo que é sinónimo de opressão, desigualdade e medo, não podendo pais e alunos intervir nas escolhas que dizem respeito ao seu futuro, e de livremente poderem sequer escolher a escola onde vão formar-se profissionalmente.


Mas Sócrates não fugiu aos problemas…. Pelo contrário! Mencionou o caso da Lei do Aborto e a inusitada posição da Madeira que, cumprindo a Lei vigente, apelou às instâncias da República para que seja adiada a sua aplicação até que no território existam as condições mínimas necessárias à sua concretização.


No caso em apreço, e tentando envolver eleitoralisticamente os partidos da dita oposição, Sócrates considerou inadmissível que na Madeira se tenham tomado estas decisões e que, em Portugal, os restantes partidos se tenham quedado em silêncio perante o facto.


Mas que silêncio? Mas que posições? Mas que Portugal é este de que Sócrates fala com posições cinematograficamente estudadas e poses de estadista estudadas de véspera? Que Portugal é este que não admite a um governo regional, constitucionalmente constituído e fazendo uso das prerrogativas que a Lei lhe oferece, o apelo às instâncias da República para resolver um problema que afecta a sua população? Mas que Portugal é este que Sócrates descreve como um paraíso na Terra mas onde se sente medo de falar, de expressar opiniões, de discordar de sua excelência? Mas que raio de Portugal é este, que Sócrates diz ser de respeito, e que desrespeita sistematicamente o indivíduo em detrimento do grupo, e põe a trabalhar até à morte pessoas doentes; não permite que as instituições utilizem os meios legais ao seu alcance, e persiga pessoas que, até na Internet (sem insultar sua excelência), vêm discordar do Governo? Mas que País é este onde o único problema é o não-problema mencionado pelo senhor em questão?


O que é inadmissível, num Estado de Direito, em pleno Século XXI, é que alguém institucionalmente responsável pelo País, possa vir à televisão descrever um País que não existe, deturpando a realidade e a verdade em que todos vivemos, e criando à sua volta um clima de medo que impede que se possa vir por em causa aquilo que ele oficialmente vem publicamente dizer.


Quando Manuel Alegre (socialista de sempre) mencionou ontem mesmo o medo que o Estado socialista tem vindo a fazer nascer, descreveu com acuidade, discernimento, e com total transparência, o País real que Sócrates parece não querer ver.


E o silêncio na entrevista de ontem sobre este Portugal real, é verdadeiramente inadmissível…

O Medo em Portugal




por: João Aníbal Henriques



Enfrentando uma vez mais o aparelho partidário, Manuel Alegre vem hoje a público falar do medo que tolhe o dia-a-dia dos portugueses e, principalmente, da forma como o Estado socialista tem vindo a proceder de uma maneira que promove a falta de liberdade nas suas mais variadas expressões.


O medo de que fala, mais do que directamente relacionável com um determinado problema e/ou situação, prende-se com algo de não concretizável, ou seja, a situações que, sempre pela calada e de forma não assumida, acabam por criar na comunidade um sentimento de permanente apreensão que inibe determinados tipos de comportamentos.


A gravidade da situação, que todos sabemos ter implicações directas no quotidiano dos cidadãos, no seu emprego, comunidade, vida social ou mesmo na família, é maior se pensarmos que ela tolhe (ainda mais) a já de si calcinada possibilidade de todos terem (e poderem exercer) o seu direito individual à diferença e à opinião para expressarem o que pensam e o que sentem relativamente ao Estado e ao Governo. E esta gravidade, que na prática pouco ou nada se sente em Portugal, País habituado à embriaguez de um fim-de-semana passado no centro comercial e à fila de trânsito em direcção à Quarteira ou à Costa da Caparica, é ainda mais problemática se pensarmos nas implicações que tem na prática democrática e na capacidade de representação que o Estado deve ter relativamente aos cidadãos.


Sabemos, de antemão, que a liberdade de escolha, génese da democracia, se centra na possibilidade de cada um poder exprimir a sua opinião livremente, em grande respeito pela opinião alheia, e em contribuição positiva para o bem comum. Também sabemos que em Portugal, infelizmente, essa mesma capacidade esta coarctada pelo facto de o sistema político estar controlado pelos partidos políticos que, exercendo todas as premissas que o poder lhes confere, lutam ferozmente para que a dita sociedade civil não encontre espaço de trabalho para a sua afirmação comunitária.


Por isso, ao refrear ainda mais a liberdade inerente à expressão, o medo mencionado hoje por Manuel Alegre é mais um passo no sentido da não afirmação individual e, com isso, um contributo efectivo para travar a possibilidade de criação de uma verdadeira democracia representativa em Portugal.


Depois das recentes eleições para a Câmara Municipal de Lisboa, e da desastrosa prestação dos partidos, ficou bem evidente que a democracia (tal como foi concebida pelos obscurecidos mentores de Abril) está morta. Também se viu que, mesmo preso nas teias emaranhadas dos partidos de onde saiu, o designado “fenómeno independente” teve repercussões efectivas, evidentes e drásticas nos resultados…


Parece, por isso, que o medo criado pelo aparelho socialista, que Manuel Alegre tão bem identifica no seu artigo de ontem, mais não é de que uma resposta ao medo (esse sim real e com causa definível) que o partidarizado sistema político português sente por ver aproximar-se o momento em que, afirmando-se de forma efectiva, os portugueses vão tomar conta de Portugal.


Sem medo, sem temor perante as consequências e com a coragem de quem sabe que a próxima década e a próxima geração, serão decisivas para o devir histórico de Portugal, a sociedade civil, independente, consciente e livre, vai assumir o seu destino, e criará uma nova democracia no nosso País.


Nessa altura, independentemente de ideologias, posicionamentos práticos, projectos pessoais, ambições corporativas, poder, credo ou cor, Portugal vai mostrar que é possível não ter medo.

sexta-feira

Nascer em Portugal



por: João Aníbal Henriques

No debate que hoje decorreu no Parlamento Português, José Sócrates anunciou que vai criar medidas de incentivo à natalidade.


Este anúncio, feito pouco tempo depois da publicação de estudos recentes que apontam para problemas graves na nossa pirâmide social dentro de pouco mais de uma geração, com um aumento exponencial e quase incontrolado do número de idosos dependentes relativamente aos jovens e aos adultos com capacidade produtiva, era já expectável e afigura mais uma das vicissitudes graves de que enferma o nosso sistema.


Ainda está fresca na () memória de todos os portugueses, a recente campanha a favor do aborto e contra a vida, como estará também bem presente o esforço que Sócrates e o Partido Socialista fizeram para que se legalizasse com rapidez aquela prática. Mesmo sabendo que há menos de dez anos um primeiro referendo havia chumbado a legalização da atrocidade, a pressão sistemática de grupos, partidos e organizações de esquerda, obrigaram o Governo a assumir a sua posição contrária à vida e a defesa de mais um instrumento de morte.


Sem (re)entrar na discussão argumentativa relativamente à posição anti-aborto que é, por factores históricos, religiosos e sociais, aquela que melhor traduz a essência da Portugalidade, parece ficar bem patente que o anúncio de hoje é um contra-senso que, apesar de vir ao encontro das necessidades reais de Portugal, acaba por pôr em causa as posições que o Governo tomou há poucos meses atrás.


As medidas pró-vida que o primeiro-ministro vem agora anunciar, alicerçadas em condicionantes de ordem económica, pois a falência do sistema de segurança social será acelerada à medida em que a taxa de envelhecimento populacional de agrava, são a prova mais cabal da ineficácia das nossas instituições representativas, e das motivações que, colocadas sempre à frente dos interesses de Portugal, acabam por servir de mote à tomada de posições, decisões e às intervenções públicas de quem nos diz governar.


Todos sabíamos, quando o aborto foi legalizado e até muitos anos antes (lembro-me de ouvir uma palestra sobre o efeito dada pelo antigo presidente do CDS, Lucas Pires, algures nos idos de 80), qual era o grau de envelhecimento da população, e quais as repercussões que tal tinha no devir futuro da Nação. Todos tínhamos consciência que, sem um apelo constante, permanente e profícuo à vida, feito desde os bancos das escolas, até às empresas e aos demais ramos da sociedade civil, o envelhecimento populacional que nos afecta acabaria por pôr em causa a própria existência futura de Portugal.


Por isso, quando se digladiaram em torno da legalização do aborto, todas as posições tomadas pelos partidos que nele se envolveram tiveram como critério de base não o principal interesse de Portugal, que era o de zelar pelo crescimento da nossa natalidade, nem sequer fundamentos ideológicos que suportassem as posições, mas sim o interesse eleitoralístico momentâneo que fez com que fosse politicamente correcto (e rendesse votos) ser a favor do aborto naquela ocasião. Agora, quando está em causa um eventual aumento (drástico) das contribuições para a segurança social, que é uma das únicas formas de prolongar por uns tempos a agonia do sistema, e sabendo de antemão que serão extremamente impopulares todas as medidas que se venham a tomar nesse sentido, os mesmos que defenderam a morte vêm agora defender a vida… dando o dito por não dito… contradizendo-se descaradamente… e somente porque, daqui para frente, dará votos dizer-se que se fez tudo o que era possível, para inverter esta tendência de envelhecimento de Portugal!...


A conclusão a que chegamos só pode ser uma: não representando praticamente ninguém (o Presidente da Câmara de Lisboa foi eleito recentemente com os votos de 10% dos lisboetas…), os partidos políticos que temos são nefastos aos interesses de Portugal.

terça-feira

José Saramago e Portugal





Por: João Aníbal Henriques


Apesar do respeito que fica a dever-se a muitas horas de puro deleite em torno das palavras que preenchem de forma (quase) genial as muitas obras de José Saramago, não é possível, enquanto português, deixar passar sem mágoa as últimas considerações do escritor sobre a portugalidade…


Agora, passados muitos anos sobre o episódio ambíguo que envolveu Sousa Lara e o “Evangelho Segundo Jesus Cristo”, Saramago vem dar razão ao antigo governante, demonstrando de forma cabal que os seus textos, bem como a perspectiva que possui do Mundo, dos Homens e da sociedade, são uma distorção completa e absoluta dos principais valores que deveriam presidir à organização do nosso quotidiano.


Portugal e os portugueses, Nação criada e consubstanciada há mais de 800 anos, não é passível de interpretações de carácter económico-financeiro… Portugal é uma das mais antigas Nações do Mundo e, com toda a certeza, uma das mais solidamente estruturadas no seio da Península Ibérica.


A Espanha (ou mesmo a Ibéria de que Saramago fala) não é mais do que a soma artificial de uma série de Nações diferentes e, dada a artificialidade que as agrega, sujeitas a períodos de grande conflitualidade e negação que, conforme facilmente se percebe na recente História de Espanha, são sinónimo de mal-estar, profunda crise, e insegurança no País vizinho.


Mas como, negando todos os valores, princípios e caminhos da doutrina comunista que diz defender, Saramago apela à economia para explicar a tal necessidade de Portugal se integrar no universo espanhol, também por aí se vê que nada daquilo que diz faz sentido para Portugal e para os portugueses. E por várias razões…


Em primeiro lugar porque a Nação portuguesa está hoje, no âmbito da sua integração europeia, espartilhada enquanto País pela crescente federação da Europa que, embora demasiadamente frágil para tocar nos princípios basilares da sua portugalidade, já actua de forma quase total nas estruturas representativas e governativas do País. Portugal, nos dias de hoje, mantém o estatuto de Nação, mas perdeu (parece-me por completo) a sua autonomia enquanto País. Portugal não decide, não legisla, não cunha moeda, não pode definir estrategicamente o seu futuro. Logo, Portugal já não é um País independente que possa decidir integrar-se no Estado Espanhol.


Por outro lado, e de forma consistente ao longo da sua História, torna-se fácil de perceber que nunca existiram razões concretas para a sua independência Nacional. Não há explicações de âmbito económico, financeiro, estratégico, geográfico, cultural, étnico, político, etc. A única razão que presidiu à constituição da Nação Portuguesa, tal como Sousa Lara tão bem percebeu quando exerceu o seu mandato como Subsecretário de Estado da Cultura, foi de âmbito quase sagrado, sempre em torno de princípios morais (por vezes também de cunho religioso), naturalmente partilhados desde há muito por todos aqueles que viviam neste nosso território português.


Portugal não foi criado. Portugal nasceu. Portugal nasceu de parto natural; nasceu no coração dos portugueses; Portugal está registado na informação genética da sua comunidade e no ADN dos portugueses.


É por isso que Portugal resiste a tudo… guerras, revoluções, terramotos, invasões, etc. etc. etc. É também por isso que, mesmo longe de Portugal; mesmo do outro lado do Mundo; mesmo três ou quatro gerações depois de saírem de Portugal; os portugueses mantêm a sua portugalidade… e mesmo quando a negam, emocionam-se com a nossa emoção, e vivem de coração aberto as grande causas que, pontualmente, vão mostrando ao Mundo qual é a única razão que sustenta a existência de Portugal…


Não perceber isto é não ser português. E quem não é português não pode (mesmo que queira) trair Portugal.


José Saramago, Nobel da Literatura e génio da escrita, não traiu Portugal. Pôs simplesmente em causa os princípios e os valores que norteiam um País que não é o seu, que ele não entende, que ele não é capaz de sentir…


Que viva (longe) muitos e longos anos, produzindo obras-primas da literatura Mundial. Mas que não volte a pronunciar-se (nunca mais) sobre este Nosso Portugal!


segunda-feira

Vitória de Lisboa



por: João Aníbal Henriques

Ao contrário do que muitos esperavam, foram um êxito estrondoso as eleições intercalares para a Câmara Municipal de Lisboa.


A indiferença perante o acontecimento mediático e o circo que se montou, aliado à falta de critérios, projectos, ideias sustentadas e visão real sobre o planeamento e a gestão futuros da cidade, foram a principal marca daquele que será, porventura, um dos mais importantes acontecimentos da Lisboa contemporânea.


O índice de abstenção, semelhante em termos de tendência àquele que se tem vindo a verificar paulatinamente de eleição em eleição, bateu quase todos os recordes, e os que foram votar, mostrando discernimento e capacidade de entender os muitos cenários que se poderiam colocar, escolheram faze-lo de forma minuciosa e cuidada, dando a cada um dos 12 candidatos aquilo que mereciam receber.


Vamos analisar um por um:


António Costa – O Vencedor


Desde logo cantou bem alto a sua vitória… e o que é que ele ganhou? Ganhou uma câmara sem maioria, através de um plebiscito em que o apoiaram nas urnas 57.907 cidadãos de Lisboa. É fácil de perceber que correspondem a pouco mais de 10% da população e que, pela primeira vez em 33 anos, vamos ter um Presidente da Câmara eleito por 10% dos eleitores. Mas isso retira-lhe legitimidade? É óbvio que não… apesar de ter diminuído a cotação em relação ao derrotado de 2005 (Manuel maria carrilho teve 75.022 votos), António Costa foi o mais votado de todos os pobres candidatos que os lisboetas resolverem pura e simplesmente desprezar. E qual é a sua representatividade efectiva? É fácil de perceber que ronda os tais 10% de pessoas que nele votarem, e não está muito longe daquela que caracteriza o Governo e muitos dos demais órgãos de soberania…



Carmona Rodrigues – O Herói…


Contra o partido que o elegeu em 2005; contra os restantes partidos que nele encontraram o “bode espiatório” para todos os males de Lisboa que eles próprios haviam criado; contra a comunicação social e os muitos lobbies e grupos de interesse que entendiam um bom resultado seu como uma possível machadada no seu poder e capacidade de imporem soluções para a Cidade, Carmona Rodrigues conseguiu a proeza de conquistar o segundo lugar, à frente do partido que minou o seu trabalho, e com imenso apoio popular. Sem querer entrar no campo das suposições, que nos levariam a um cenário de eleições participadas e com baixa taxa de abstenção que certamente aumentariam de forma exponencial o seu resultado e (provavelmente) lhe dariam a vitória, há que sublinhar que foi, de facto, um vencedor, mostrando a Portugal e aos portugueses que vale a pena manter a isenção, a independência e o rigor que só a sua seriedade de português lhe podem garantir.



Fernando Negrão – Qual?...


Fernando Negrão e o PSD merecem poucos comentário após o descalabro que motivaram na Câmara de Lisboa. Em relação ao partido pouco há a dizer… criou a situação ao colocar os interesses da sua estrutura à frente dos interesses da Cidade, e os lisboetas penalizaram-no por isso. Talvez a única preocupação que subsiste seja a de imaginarmos o cenário que espera este partido nas legislativas de 2009… é que, apesar do seu carácter inócuo, dentro desta ditadura partidarizada em que vivemos, é a única solução que resta como alternativa a um PS escandalosamente anti-Portugal! Quanto a Negrão, a situação é ainda mais terrível. Candidatou-se a Setúbal. Perdeu quando se percebeu que nada tinha a dar à cidade e… fugiu dali, provando que tinham razão todos aqueles que criticaram a sua candidatura contra natura. Depois foi uma recambolesca passagem pelo Governo, abordando temas, assuntos e áreas que não eram as suas e que, mesmo com o seu ar simpático e competente, comprometeram ainda mais a já enfraquecida credibilidade que trazia das margens do Sado. E por fim, quando tal deveria ser a última coisa a fazer, resolveu vir para Lisboa… Lisboa? Mas porquê? Então mas o Homem não tinha garantido ainda há 2 anos que o seu coração estava em Setúbal? Não se consegue perceber…


Telmo Correia – O Outro…


Um dos inesperados protagonistas da noite foi Telmo Correia e o CDS-PP… Pugnando com rigor, disciplina, serenidade, seriedade e empenho por um projecto novo para Lisboa (digo isto acreditando verdadeiramente que se Telmo Correia fosse eleito presidente com maioria absoluta Lisboa tornar-se-ia uma das cidade de referência no contexto europeu), não percebeu uma das mais importantes e evidentes premissas da democracia em Portugal: a Direita, com os seus valores e princípios, não gera votos em quantidade suficiente para ganhar eleições. Por isso, a reboque das gananciosas pretensões ao poder do seu popular presidente de partido, acabou por deixar de lado aquele que seria (ou deveria ser) um dos principais objectivos de todo o empenhamento que colocou na candidatura: unir a direita portuguesa a partir de Lisboa. E é fácil entender que, juntando os seus votos com os de Manuel Monteiro (ainda se podiam juntar os de outros candidatos menos ortodoxos que também acreditam, pugnam e zelam por Portugal e pelos portugueses), Telmo Correia não só seria eleito, como possivelmente conseguiria, com esse facto, fomentar uma dinâmica nova que servisse de ensejo para consolidar uma Direita responsável, consciente, e… assumidamente alheada da partidarite viciosa à qual acorrentaram Portugal.


Os restantes…


O que dizer sobre todos os outros? Possivelmente nada. Da pseudo-independente Helena Roseta (ex-PSD e ex-PS); ao comunista Rúben de Carvalho; ao inconsequente José Sá Fernandes; ao indefectível Garcia Pereira; ao cantor da Câmara Pereira; ou ao iludido Manuel Monteiro; vai um caminho curto e insidioso. Todos eles participaram no sistema e contribuíram, com o seu trabalho, para credibilizar um acto que contraria os interesses reais de Lisboa, dos lisboetas, de Portugal e dos portugueses. Os números falam por si, e se cada um deles for ver com atenção quantas foram as pessoas que se deram ao trabalho de votar em si, verão que tudo o que fizeram não merece sequer uma palavra…


Conclusão:


Apesar de tudo, de todos, de Portugal, da nossa comunidade, dos atropelos à democracia que todos dizem defender, as eleições para a Câmara de Lisboa realizaram-se. Gastou-se uma verba substancial do erário público; comprometeram-se investimentos que eram essenciais para o desenvolvimento do País; e descredibilizou-se ainda mais uma classe política ávida de poder mas vazia de projectos.


A partir de agora, com a vitória que conseguiram nestas eleições, os 62,61% de lisboetas que decidiram (e bem) não ir votar, deram todas as informações de que necessitávamos para modificar finalmente este nosso Portugal. Esperemos que, percebendo a mensagem e ao contrário do que se passou em 1974, o povo não tenha de vir à rua para devolver Portugal aos portugueses…

quarta-feira

Independentes em Lisboa




por: João Aníbal Henriques



Helena Roseta, candidata à Presidência da Câmara Municipal de Lisboa e invocando o estatuto de ‘Independente’, veio hoje afirmar, e ainda por cima de forma convicta e assumida, que os “partidos precisam de levar uma lição”.


Na situação política em que Portugal está, com um regime dito democrático onde quem manda são os partidos, e no qual a representatividade civil está reduzida a uma expressão insignificante e quase exclusivamente restringida a três ou quatro figuras despartidarizadas que, num volte face quase macabro, se independentizam em prol de uma causa (leia-se cargo), é difícil perceber que ninguém se revolta ao ouvir uma coisas destas.


E por vários motivos…


Em primeiro lugar porque a senhora em questão ocupou até agora cargos públicos de grande relevo e destaque, nos quais a independência nunca foi preocupação dominante; em segundo lugar porque a mesma senhora ocupou esses cargos à sombra de vários partidos, assumindo convictamente os ideais de cada um deles e, depois, contrariando esses mesmos ideais em defesa dos contrários que então passou a abraçar; e por último, porque ao longo da sua vida política, a senhora já foi presidente de uma das Câmaras Municipais mais importantes deste País, tendo deixado atrás de si a má memória de quem não foi capaz de gerir o Concelho em questão (Cascais) criando os instrumentos mínimos de regulamentação do território que (pelo menos) prevenissem o caos urbanístico que estava nessa altura a nascer, e que praticamente destruiu Cascais ao longo dos 20 anos seguintes.


Se, conforme parece ficar subentendido das suas palavras, é a partidarite que condiciona negativamente o desempenho político dos nossos autarcas, então teríamos qualquer coisa que explicava de razoável a sua passagem por Cascais em representação do PSD, e mais tarde pela Assembleia da República em representação do PS. E para nós, que desde há muito culpamos a falta de representatividade dos partidos que temos pelo clima de incúria permanente em que Portugal vem vivendo desde há mais três décadas, tal seria motivo de apoio incondicional e aplauso imediato.


Mas a senhora em questão foi militante socialista, desempenhando cargos de grande relevo, notoriedade e importância nessa condição, até há algumas semanas atrás! Não foi há décadas, anos ou meses que ela percebeu isso e se desfiliou. Foi há semanas! Foi somente quando precisou de se desfiliar para ser A candidata à edilidade lisboeta.


Será que tudo mudou desde a apresentação da sua candidatura à Câmara de Lisboa? Será que abriu finalmente os olhos depois de décadas partidarizadas em vários cargos públicos? O que será que aconteceu?!...


De facto, e sabendo de antemão que depois do próximo Domingo tudo vai ficar na mesma no Município de Lisboa, e que serão os mesmos partidos, da mesma forma, a negociarem entre si os mesmos apoios necessários à manutenção do seu poder, é pouco preocupante que os militantes A, B ou C deste ou daquele partido contradigam toda a sua vida abraçando a causa da independência. Aliás, é tudo de tal maneira irrelevante que quase não se percebe como ganha tanta notoriedade um acto tão inócuo e inconsequente para Portugal e para a Cidade de Lisboa.


O que é verdadeira e clamorosamente preocupante, porque mostra que vivemos hoje numa sociedade anestesiada por um sistema viciado onde quase nada é aquilo que parece, é perceber que, depois de estas palavras terem sido proferidas por quem foram, da forma como foram, na ocasião em que foram, e no local onde foram, não se vislumbram reacções de maior por parte dos portugueses.


E a razão para essa preocupação é simples de perceber: já não existe Sociedade Civil em Portugal! Parece que morreram finalmente, depois de trinta e três anos de sofrimento, os últimos resquícios do verdadeiro Portugal.


Agora, de forma comprovada, podem todos os partidos (legalizados) respirar de alívio, porque já não há ninguém que os impeça de dizer e fazer o que lhes interessa…


sexta-feira

Montemor-o-Novo: Maravilha de Portugal





Por: João Aníbal Henriques




Amanhã, numa cerimónia tida como de grandes repercussões para o nosso País, Portugal vai receber a gala que marca a escolha das novas sete maravilhas do Mundo.


A pompa e a circunstância que rodeiam o evento, com locais, monumentos e sítios candidatos ao novo estatuto em ânsia completa, contrasta com uma generalizada e descontraída postura distante que os portugueses têm demonstrado relativamente a ele.


E a razão que explica esse fenómeno tem a haver com um facto simples e de fácil percepção: Portugal, sozinho e por si próprio tem um conjunto de maravilhas que ultrapassam largamente as sete que vão ser escolhidas oficialmente no dia de amanhã.


Complementando essa certeza (que é arreigadamente aceite por todos os portugueses que conhecem minimamente Portugal), está outro facto completamente devastador… as maravilhas de Portugal, espalhadas de Norte a Sul, do Minho ao Algarve, e do Litoral ao Interior, estão na sua grande maioria fechadas, sem acesso público ou, em contrapartida num completo estado de abandono e ruína.


A título de exemplo, e somente porque é, sem qualquer sombra de dúvidas, um local maravilhoso, deslumbrante, desconhecido e… abandonado, vamos ver o que se passa com o Castelo de Montemor-o-Novo.


Neste caso específico, e reunindo tudo aquilo que lhe permitiria transformar-se num atractivo pólo gerador de riqueza turística para Portugal, o Castelo de Montemor-o-Novo está aberto ao público mas num estado de abandono e ruína avançada. Sem explicação aparente (ou pelo menos aceitável) para o facto, verifica-se que à incúria, se junta uma completa falta de informação sobre o espaço. Quem o visita casualmente, por estar em passeio normalmente em direcção à pujante cidade de Évora, debate-se com duas sensações distintas: numa primeira fase o deslumbre completo pela maravilha com que se depara; e numa segunda fase com uma dificuldade extraordinária em perceber, compreender e saber qualquer coisa mais sobre o espaço em questão.


Conclusão: quem lá chega fica deslumbrado, mas sai daí a poucos minutos completamente desiludido… e aquilo que poderia ser um espaço de memória e de memórias, torna-se rapidamente num local de má memória e de esquecimento!


Recentemente, depois de muitos anos de vil abandono, algo foi feito no espaço do castelo. Complementando escavações arqueológicas morosas (e imagina-se que complexas), foi efectuada uma importante obra de recuperação da Capela de São Tiago, que se transformou assim na única zona recuperada dentro do recinto acastelado.


Pensar-se-ia que essa recuperação poderia inverter o clima geral de degradação do espaço envolvente… mas não. Ao invés de cativar à visita, de servir de pólo explicativo e interpretativo do castelo e da Cidade de Montemor-o-Novo, de mostrar a região e de aliciar os visitantes ocasionais que por ali passam para que entendam, compreendam e promovam aquela autêntica maravilha, cobra-se à entrada uma taxa de acesso que inibe a visita ao seu interior.


Pergunta-se: será legítimo cobrar um bilhete de entrada num Monumento Nacional? A resposta é clara e evidente: Claro que sim! Ela é necessária para manter o espaço, para zelar pela sua segurança e até para cobrir custos com a investigação que permita enriquecer ainda mais aquilo que se sabe sobre ele.


Mas neste caso específico, com uma envolvência de ruína completa e de abandono total; com a paragem ocasional de viajantes que não planeiam entrar; com o carácter Nacional de mais de 90% dos visitantes; com o facto de muitos deles serem famílias portuguesas e não existir um bilhete de família o que transforma uma visita de 5 minutos num custo exagerado para 4 ou 5 pessoas; com a potencialidade que o próprio espaço tem para fornecer sentido a tudo o que está à volta…


Fazia muito sentido que não se pagasse a entrada.


Sob pena de, mesmo no meio das mais extraordinárias maravilhas que existem em Portugal, continuarmos a perder a oportunidade de deslumbrar os portugueses e de lhes mostrar que a maior maravilha que temos é, efectivamente… Portugal!

terça-feira

ISAF - Cascais e o Mundial de Vela 2007...




por: João Aníbal Henriques

Começa hoje em Cascais o Campeonato do Mundo de Vela, numa iniciativa de grande visibilidade e notoriedade que colocará a Costa do Estoril nos principais órgãos de comunicação social do Mundo durante pelo menos 15 dias.


Trazendo a Cascais algumas centenas dos principais velejadores do Mundo e, simultaneamente, alguns dos mais conceituados jornalistas internacionais, o Mundial de Vela é também mote para a visita de numerosas comitivas oficiais, comités olímpicos, representantes de diversos estados, etc., facto que transforma este evento num acontecimento único na região.


Com o seu carácter de excepção, pela qualidade dos participantes e pela repercussão que terá na assumpção de Cascais como destino principal desta modalidade, o Mundial de Vela de 2007 é também uma oportunidade dourada para mostrar a Costa do Estoril, Lisboa e o próprio País, aproveitando o facto de estarem cá os denominados “opinion makers” da actualidade.


A ideia (errada) que ainda subsiste lá fora, de que Portugal é um País que em termos turísticos se resume ao Algarve, com as suas praias, água morna e desordenamento urbanístico, pode ser agora invertida, mostrando o que temos, e deslumbrando os que cá estão com o nosso património, História, monumentos, paisagem, clima, gastronomia, vinhos, campos de golfe, etc. etc. etc.


No entanto, e apesar desta reconhecida importância que o evento poderia ter para Portugal, Cascais e a Costa do Estoril, parece que muito pouco está a ser feito nesse sentido. A hotelaria local está com uma de ocupação que ronda os 50%; o comércio local queixa-se de uma crise acentuada devido aos constrangimentos ao nível do tráfego e do estacionamento que afastam de Cascais os visitantes usuais sem trazer como contrapartida novos públicos; e os restaurantes só com dificuldade vão conseguindo convencer os clientes locais a um esforço acrescido para continuarem a utilizar os seus serviços.


Em termos de promoção, e sem explicação aparente, nada se fez para deslumbrar os novos visitantes. Chegam à região; instalam-se no hotel; saem de manhã para assistir às regatas; e todo o tempo livre é gasto em Lisboa e Sintra… É ali que fazem compras; visitam museus; jantam; e se divertem à noite, voltando a Cascais unicamente para repetir a rotina do dormir e assistir às provas.


Estando no primeiro dia de provas, e com mais doze daqui para a frente, esperemos que seja ainda possível inverter a situação, criando as condições necessárias para que todo o esforço e investimento que Cascais está a fazer neste evento, tenha por parte das entidades responsáveis pela organização do mesmo, o reconhecimento que merece…


segunda-feira

Portugal, a Europa e... África!



por: João Aníbal Henriques


Num brilhante artigo de opinião no Diário de Notícias de hoje, o jornalista Sena Santos, provavelmente imbuído do espírito europeu que resulta do início da Presidência Portuguesa da União Europeia, apresenta a Portugal o nunca concretizado (mas sempre presente) projecto de criação dos Estados Unidos de África.

Citando o Presidente da Líbia, Sena Santos refere ainda que a divisão no continente africano se fica a dever à intervenção da Europa e dos Estados Unidos que, dependendo em grande escala dos recursos daquele continente, geram uma série de estratégias político-económicas que procuram manter em clima de grande instabilidade os muitos países ali existentes.

Se olharmos para a História recente do Mundo, há um facto que corrobora as opiniões tantas vezes insensatas do presidente líbio… a Conferência de Berlim, de génese europeísta, traçou com régua e esquadro (para não dizer com esquadro e compasso) o novo mapa das “nações” africanas, impondo um desenho de fronteiras que nada tem a haver com as reais Nacionalidades milenares (com bases políticas, económicas, religiosas e sobretudo culturais) pré-existentes. Misturaram-se etnias, credos, cores, interesses, princípios e doutrinas em nome de pseudo-nações que nunca o foram, e gerou-se um clima de instabilidade permanente, morte constante e fome assolapada, que resulta do facto de esses países não possuírem este substrato Nacional.

E quem ganhou com isso? A resposta é óbvia e de todos conhecida… os Estados Unidos da América e a Europa dita industrializada. Ambas as partes, apoiando e desapoiando grupos, grupelhos, pseudo-partidos políticos e formas de viver culturalmente impossíveis de concretizar naquele continente, fomentaram a guerra permanente em nome de uma democracia que serve de desculpa e pano de fundo para tudo aquilo que por ali se queria fazer.

Mas em primeiro dia de presidência portuguesa, chegamos finalmente a Portugal!

Portugal, situado num extremo do velho continente, e com as costas voltadas à Europa, assume milenarmente a sua vocação atlântica. E essa, como desde cedo o perceberam os nossos avoengos predecessores, só poderia resultar numa aproximação àqueles que connosco partilham sentimentos, crenças, interesses e emoções.

África, ali mesmo à frente do nosso nariz, partilha connosco quase tudo. Que o digam os milhares de africanos que connosco vivem desde há gerações, e os muitos portugueses que durante Séculos viveram, nasceram, cresceram e morreram em África, e de onde não teriam retornado se não fossem as revoluções que nos impuseram…

E um pouco mais à frente, já no continente americano, o Brasil… com quem desde sempre partilhámos tudo, e com o qual metade dos portugueses se identificam claramente. Agostinho da Silva, na sua faceta de erudito da portugalidade, dizia amiúde que o Brasil é África com coração de Portugal.

E agora, quando José Sócrates (o engenheiro) vem dizer que existe um largo consenso sobre europeísmo em Portugal, parece impossível que ninguém lhe explique duas coisas essenciais:

1. Portugal é muito mais africano do que Europeu;

2. Nuns Estados Unidos de África, riquíssimos em termos culturais, em termos de recursos, em termos de meios humanos, em termos de matérias-primas, etc. Portugal, enquanto enclave africano na Europa, poderia fazer toda a diferença, a bem de si próprio, dos portugueses e de milhões e milhões de africanos que, dessa forma, teriam podido evitar guerras, fomes, doenças e o controle externo que desde há mais de trinta anos os tem vindo a afectar.

No início da presidência portuguesa da Europa só apetece gritar bem alto: Viva África!

sexta-feira

O Tratado de Lisboa


por João Aníbal Henriques


A pouco mais de dois dias de assumir (pela terceira vez) a Presidência da Comunidade Europeia, num acto de mais simbolismo do que de importância prática, o Governo de Sócrates indicou claramente ao Parlamento quais são as suas prioridades fundamentais para este importante período.

Contrariamente ao que seria de esperar, sobretudo se tivermos em conta o estado caótico em que se encontra o nosso Estado; a situação quase miserável em que estão a ser deixadas as famílias portuguesas, com um aumento brutal da carga fiscal, acompanhada pelo agravamento das taxas de juros e de uma inquietante possibilidade de a curto prazo perder regalias essenciais nas áreas da saúde, educação e segurança social; e a cada vez mais delirante perseguição que começaram a sofrer todos aqueles que têm o vil descaramento de discordar publicamente com o Governo, o Primeiro-Ministro ou um qualquer responsável político português; nenhuma das prioridades do PS para esta presidência tem qualquer coisa a haver com Portugal e os portugueses. Pelo contrário.

A única preocupação reside numa necessidade efectiva do Governo e do nosso actual Primeiro-Ministro: inscrever o seu nome na História da Europa. E para isso, no quadro de um possível futuro tratado europeu que terá consequência efectivas e permanentes no futuro do País e no dia-a-dia dos portugueses, opta-se por concentrar todos os esforços na assinatura do documento. E para quê? O Primeiro-Ministro respondeu de forma irredutível no Parlamento… para que se chame “Tratado de Lisboa”.

Como é evidente, porque o dito tratado ainda nem sequer foi redigido, não sabemos se será bom ou mau para Portugal. Agora que estamos na Europa, condenamos estamos também a fazer o melhor possível para acompanhar o que essa Europa faz (apesar de já estar provado que pouco ou nada temos a haver com ela). Mas o tratado em questão, independentemente da nossa opinião sobre ele, terá influência directa no nosso futuro Nacional e, quanto mais não fosse por isso, deveria ser sujeito à análise, consulta e decisão dos portugueses.

Para mim, que não me revejo na figura, nas escolhas, no posicionamento, nem na prática deste Governo e que, por isso, não me sinto representado por ele, é assustador pensar que quem não consegue responder cabalmente aos interesses de Portugal em questões práticas internas (o aeroporto, o TGV, a privatização dos hospitais, a degradação do ensino, etc. são apenas alguns exemplos), venha a ser o responsável por uma decisão que vai condicionar o meu futuro e o dos meus filhos.

Como português, e em nome de Portugal, não posso aceitar de ânimo leve que, em troca do nome de Sócrates e de Lisboa neste tratado, se tomem decisões nas quais os portugueses não são tidos em conta.

quarta-feira

Cascais...




por: João Aníbal Henriques


Cascais é um lugar especial…

Desde o princípio dos tempos, quando os primeiros homens chegaram à Europa, que o espaço hoje ocupado pela Vila e Concelho de Cascais assumiram um papel decisivo na fixação das comunidades humanas.

Este facto, comprovado pelas evidência arqueológicas, tem a haver não só com as condições naturais únicas que o lugar possui, e que vão de um micro-clima privilegiado, a uma paisagem extraordinária, e um conjunto de férteis campos onde não falta nem água, nem alimentos, nem animais, mas também com uma espécie de magia inebriante que surge como consequência do bem-estar que o Homem sente quando aqui se instala.

O fenómeno de atractividade de Cascais sobre as pessoas, que hoje todos conhecem e reconhecem, é assim transversal no tempo e no espaço, pois o Concelho foi paulatinamente assistindo à consolidação da sua comunidade humana. Por outro lado, e num fenómeno também hoje bem visível, a origem daqueles que escolhem Cascais para se instalar, é o mais diversa possível.

Cascais, no seu cosmopolitismo, é um dos Concelhos portugueses com melhores condições para atrair visitantes e se transformar num dos mais importantes pólos turísticos da Europa.

Tem tudo aquilo que é necessário para atrair os visitantes; tem um carisma difícil de definir; e tem sobretudo um enquadramento de paz e de segurança que, nos dias que correm, é condição essencial na escolha do destino de férias de qualquer família que preze a sua integridade e a dos seus.

Por isso, reunidas que estão as condições para que tal aconteça, só falta uma coisa: mostrar lá fora que Cascais é o espaço que todos (apesar de muitos deles ainda não o saberem) querem conhecer.


terça-feira

Pensar sobre... Cascais e os Estoris




por: João Aníbal Henriques


Depois de uma ausência prolongada, resultante de um período de grande e permanente intervenção cívica através de várias instituições, voltei recentemente a Cascais.

O cenário é novo, e a limpeza do espaço urbano marca agora o quotidiano da Vila, quase pronta para começar a receber os participantes no Campeonato do Mundo de Vela que vai decorrer nas águas maravilhosas da nossa baía.

Caminhando descontraidamente por Cascais, primeiro através das ruelas do burgo medieval, e depois pela Avenida Rei Humberto II, marina e Passeio Maria Pia, vão surgindo ao longe, recortados no horizonte de uma noite típica de Verão, os sinais prontos de que algo está mudar…

A beleza da paisagem, recortada aqui e ali pelo perfil romântico de alguns edifícios centenários que conseguiram escapar à fúria destrutiva do período negro de Cascais (1993-2001), só é ultrapassada pela pacatez e o sossego da envolvente.

E é ali que a surpresa surge pela primeira vez… Onde estão as pessoas de Cascais? Onde estão os visitantes? Onde estão os participantes no Mundial de Vela que começa nos próximos dias? Onde estão os turistas que enchem os hotéis que actualmente já exigem taxas de ocupação muito próximas dos 100%?

Porque razão, em muitos quilómetros percorridos em Cascais (sublinho a cálida noite de verão…) só consegui ver alguns polícias, espalhados aqui e ali nos pontos onde se vê que vão decorrer iniciativas relacionadas com o grande evento, e muitos seguranças privados que, sem muita preparação, tacto ou discernimento, exortam os poucos transeuntes a afastarem-se dos gradeamentos metálicos que ocupam as zonas mais bonitas do nosso espaço público?

A resposta é atroz.

Cascais está a receber centenas (para não dizer milhares) de novos visitantes que chegam paulatinamente todos os dias e que, para grande desespero dos naturais (diga-se comerciantes, restauração, etc.) acordam de manhã, fazem o que têm a fazer com as suas embarcações e com os preparativos para as provas, e depois seguem de imediato para jantar em Lisboa, passear na capital, fazer compras no Chiado, ou divertir-se nas Docas…
Entram numa das localidades mais bonitas de Portugal e, certamente, uma das mais maravilhosas do Mundo; demoram-se por aqui por vezes várias semanas; conhecem Lisboa, Sintra, Colares e a Praia das Maças; e... voltam a sair de Cascais sem que ninguém lhes tenha conseguido mostrar o espaço deslumbrante que tiveram a sorte de poder visitar.
E por isso, ao contrário do que acontecia há 15 ou 20 anos atrás, quando uma noite de Junho era sinónimo de ruas cheias, restaurantes repletos, bares e discotecas cheias de animação, e os bancos espalhados pela Vila plenos de conversas, confidências e sorrisos, Cascais está vazio, deserto, silencioso, mudo e triste. Apesar da limpeza, da segurança, dos novos equipamentos e de toda a extraordinária panóplia de atractivos que tem.
É atroz.


O Mito da Democracia em Portugal




Na sua mensagem a Lisboa, o Presidente da Edilidade, Professor Carmona Rodrigues, explicou em poucas palavras qual é a principal doença que afecta o sistema político português:


"Todos falam na necessidade da renovação da classe política. O certo é que o sistema político-partidário deste país não está preparado para que independentes abracem a vida política e tentam de todas as formas expelir os corpos estranhos."


Com esta declaração, curta e expressiva, Carmona Rodrigues conseguiu mostrar e demonstrar que existe uma razão (e que ela é conhecida e reconhecida pelos intervenientes na vida política Nacional) para o enorme desfasamento actualmente existente entre eleitores e eleitos, visível num crescente descrédito das instituições e numa preocupante falta de representatividade que mina a essência da Nacionalidade.


De facto, a dita sociedade civil (a mesma que entidades, partidos e instituições dizem promover) está refém da total partidarização de quase todos os sectores da vida portuguesa, não sendo possível fazer muito mais do que aquilo que interessa e convém aos partidos que detêm o poder.


As suas palavras ganham nesta altura uma importância especial, uma vez que para além de as participações nos plebiscitos ditos democráticos serem cada vez menores, mostrando que as pessoas sabem que não vale mesmo a pena estarem a perder tempo escolhendo um dos que foram escolhidos pelos partidos, estas palavras foram ditas por alguém que esteve de facto dentro do sistema, sentindo na própria pele as consequências nefastas desta situação opressiva.


Quando a grande maioria dos que pugnam (de facto) pela sociedade civil em Portugal começam a baixar os braços, compreendendo que a democracria que se diz existir só é aceite depois de avalizada por quem controla o sistema, é como que uma lufada de ar fresco assistir ao aparatado noticioso e à cobertura dada pela imprensa à expulsão de um destes corpos estranhos que, com pancadinhas nas costas dos que partidariamente o diziam defender, vem mostrar que (como sempre) democracia não é para todos, é somente para aqueles que de cartão de filiação em punho, são capazes de obedecer!...