por João Aníbal Henriques
Em 1870 Cascais mudou radicalmente. O charme e o cosmopolitismo que hoje nos caracterizam nasceram da decisão do Rei Dom Luís I de vir veranear para Cascais e do esforço efectuado pela Corte para o seguir nesta sua inusitada escolha de vir passar o Verão nesta pequena vilória de pescadores onde aparentemente não existia nada de especial.
O Cascais dos pescadores, velho, feio e muito sujo, ainda não tinha recuperado da devastação provocada pelo Terramoto de 1755 e as ruínas abundavam, emprestando à povoação um ar de degradação que contrastava com o entusiasmo do Rei que se encantou com o seu mar, a sua paisagem e as suas gentes.
O Rei Dom Luís foi uma figura insigne no Portugal do seu tempo. Herdando do Pai, o Rei Dom Fernando a sensibilidade artística e cultural dos Saxe-Coburgo-Gotha, era um dos mais cultos líderes da Europa de então, pintando, compondo e tocando música e dedicando atenção especial à leitura e à tradução das obras literárias de então. O Rei vivia fascinado pelos mares e pela imensidão azul da baía de Cascais. A ponto de pedir para morrer a olhar para ela.
Com a decisão do Rei Dom Luís Cascais transformou-se na Vila da Corte e num lugar especial. Dizia-se na Corte que Cascais era a terra em que o povo era mais nobre e a nobreza mais popular… E era comum ver o Rei, a Rainha ou os Príncipes Reais a passear descontraidamente pela vila numa proximidade quase familiar com os Cascalenses de então.
Cascais desenvolveu-se muitíssimo a partir deste momento e tornou-se o cerne da vida política, económica e social de Portugal. O Clube da Parada, o Teatro Gil Vicente ou o Casino da Praia eram os locais onde todos queriam ir para serem vistos e para verem o desfile de celebridades que os enchiam permanentemente.
Em 2020 comemoram-se 150 anos desde esta decisão histórica do Rei Dom Luís I. E mesmo tanto tempo depois, Cascais preservou o charme e a aura quase mágica de ser um lugar extraordinário e muito especial.
Numa homenagem sentida ao monarca que teve o ensejo e a coragem para criar o Cascais onde temos a sorte de poder viver no momento actual, importa subverter a História e deixar no ar a pergunta que se impõe: E se o Rei Dom Luís I não tivesse decidido vir veranear para Cascais?...