por João Aníbal Henriques
Em meados do Século XIX, numa das suas inusitadas viagens pela Europa, o
jurista e filósofo português António Duarte d’Almeida Veiga cruzou-se em Paris
com Hippolyte Léon Denizard Rivail, ilustre pedagogo e professor francês bem
conhecido do público em geral através do pseudónimo que utilizava para assinar
as suas obras: Allan Kardec. Ficaram amigos.
Na sua obra de despedida, publicada em Benavente em 1928, António Veiga
dedica à sua filha Maria Amélia aquilo a que chamou a “Lei dos Contrastes”, a
súmula do seu pensamento filosófico numa ansiada necessidade de se convencer de
que a eternidade e o infinito são expressão maior da vida verdadeira, ou seja,
daquela que emana directamente de Deus. E, acima de tudo, que a eternidade
(tempo) e o infinito (espaço) são efectivamente o contraste um do outro,
marcando a dualidade necessária para nos permitir intuir a plenitude superior
do Estado Perfeito, e concomitantemente da própria existência de Deus.
Queria encerrar a sua existência física com um legado de pensamento que
perpectuasse as suas convicções espirituais e que comprovasse aos seus filhos
que a sua partida não representaria o seu fim. Porque a morte não existe, senão
aparentemente para contrastar a vida, e podermos reconhecer esta… era para ele
um mero e puro descanso do “eu”.
Dizia ela à sua filha Maria Amélia: “a morte real só existe na ideia dos
que ficam sobrevivendo. Os que morrem para estes, não morrem na realidade,
antes, pelo contrário, revivem!”
António Duarte d’Almeida Veiga, meu bisavô paterno nasceu em Midões, nas
Beiras, e morreu em Benavente, no Ribatejo. Foi jurista, notário, filósofo e
escritor que, numa permanente ânsia de viver plenamente dedicou a sua vida a
pensar, analisar e perceber a morte. Porque acreditava que só nela se poderia
encontrar o sentido pleno da vida.
Quando se cumpre um século desde a sua morte, importa lembrá-lo e ao seu legado, até porque na linha das suas discussões espirituais com Allan Kardec, e tal como deixou escrito à sua filha Amélia: “Se soubermos convocar quem parte deste mundo infinito, eles nos provarão que existem sempre, plasmados na eternidade da qual todos fazemos parte”.