por João Aníbal Henriques
Existem locais que transcendem o
tempo com a sua capacidade de atravessar incólumes as eras pelas quais a
humanidade vai passando. É o que acontece num dos recantos menos conhecidos mas
mais emblemáticos de Arcos de Valdevez na antiquíssima capela de Nossa Senhora
da Conceição.
O vetusto monumento, erigido
provavelmente ainda no Século XIV quando Dom Fernando, o Formoso, ainda
respirava saúde e a Rainha Leonor Teles, a Aleivosa, se entretinha com o
estrangeiro João Fernandes Andeiro, é um
dos mais interessantes exemplares da arquitectura românica do Norte de
Portugal.
Essencialmente com cunho
funerário, remetendo para os ancestrais arquétipos da Senhora da Conceição, a
que concebe, a capela apresenta uma formulação espacial sóbria ao gosto da sua época,
apesar das alterações impostas na transição para o período gótico, como o arco
da frontaria principal e, mais recentemente, pelo altar de orientação “quase”
barroca e já de finais do Século XVIII.
Na sua intemporalidade
solidamente arreigada ao poder das grossas cantarias que a sustentam, a Capela
de Nossa Senhora da Conceição de Arcos de Valdevez remete-nos para um
imaginário profundamente ligado ao período de consolidação da nacionalidade, no
qual a memória antiga associada à Identidade de Portugal se mostra no seu total
esplendor, oferecendo um espectáculo emocionante no qual os princípios de uma
religiosidade católica muito profundamente sentida se misturam com os laivos
distantes de uma espiritualidade ainda bárbara mas significante.
A Senhora da Conceição, venerada
aqui através de um monumento que deixa antever a orientação sagrada da própria
localidade, assume simultaneamente a sua fácies Cristã e pagã, num esforço de
gerar consensos que estabeleçam pontes entre o passado e o futuro daqueles que
por ali lutam quotidianamente por uma sobrevivência sã. A morte e a vida,
partilhando aqui uma espécie de universo místico que contrasta de forma
evidente com a vida quotidiana que se vive lá fora, dão o mote para o choque
dual entre os contrastes formados pela luz e pela sombra, pelo calor e pelo
frio e pela magia e misticismo que se impõe à religiosidade canónica da
comunidade envolvente.
São emoções únicas que valem a pena conhecer em Arcos de
Valdevez.