por João Aníbal Henriques
Envolvida por lendas, estórias e
muitos mistérios, a Igreja de Santos-o-Velho, em Lisboa, é provavelmente um dos
mais extraordinários e interessantes recantos da cidade. Situada no final da
Rua das Janelas Verdes, junto à Lapa, o templo assume uma privilegiada posição
sobre o Rio Tejo, marcando de forma definitiva a antiga entrada de Lisboa.
Fazendo jus ao seu nome e
sublinhando a antiguidade da sua longa História, a igreja possui na fachada
principal um baixo-relevo com as figuras de três mártires-crianças do
Cristianismo, Veríssimo, Júlia e Máxima que, segundo reza a lenda, terão sido
condenados à morte no ano de 308 pelo poder político Romano.
O templo original, construído
sobre o túmulo dos mártires, serviu para tornar perene na memória de quem por
ali passa, a Fé extraordinária destas três antigas crianças lisboetas e foi
erigido no período tardo-romano, em pleno Século IV. Destruído posteriormente,
possivelmente durante a ocupação Muçulmana da Península Ibérica, foi
reconstruído depois da Conquista de Lisboa, em 1147, por Dom Afonso Henriques.
O seu filho, Dom Sancho I, ter-lhe-á dado uma nova dignidade, aumentando o
templo, elevando-o à condição de igreja e juntando-lhe o edifício do convento,
onde hoje funciona a Embaixada de França.
A sua forma actual, no entanto,
resulta de intervenções efectuadas no Século XVII, pelo Arquitecto João
Antunes, que lhe acrescentou o típico frontispício que ainda hoje se vê, e que
tapa a antiga fachada da igreja medieval. Foi também nesta altura que lhe foram
acrescentados os torreões que dão forma à fachada actual.
No Século XIX, novas intervenções
de fundo, com o acrescento da Capela-Mor, construída depois da doação do
terreno pelos Marqueses de Abrantes, vieram complementar a grandeza do templo
que definitivamente se transformou num dos principais locais de culto da Cidade
de Lisboa.
O convento, entretanto entregue à
Ordem de Santiago, foi também espaço de relevo em diversos momentos da nossa
História, tendo ficado indelevelmente ligado à desgraçada saga Nacional de 1578,
quando pela mão do Rei Dom Sebastião, Portugal se perdeu na Batalha de Alcácer
Quibir.
Diz ainda a lenda que o rei, que
muito gostava de passar temporadas neste espaço, ali ouviu Missa pela última
vez antes de embargar para a sua derradeira viagem e que terá sido ali mesmo,
algum tempo antes, que terá tomado a decisão que acabou por resultar na perda
da independência de Portugal.
Tendo sido vendido posteriormente
à família Lencastre, o antigo convento e a igreja foram revendidos ao Estado
Francês já no Século XX, ali funcionando a dependência diplomática daquele
País.
Aberta ao público a Igreja
Paroquial de Santos-o-Velho é um dos espaços que merece uma visita atenta na
Cidade de Lisboa. Para além do túmulo da Família Abrantes que ali descansa como
contrapartida da oferta do terreno onde se construiu a Capela-Mor, importa ver também
o túmulo das crianças-mártires e a impactante nave central.
Mescla de estórias e de História,
a Igreja de Santos-o-Velho é um repositório inesquecível da História de Lisboa,
carregando uma patine antiga que deriva da sua participação directa nos
principais acontecimentos da História de Portugal.