por João Aníbal Henriques
Há lugares assim… únicos,
especiais e irrepetíveis! É o que acontece com o conhecido Castelo de
Milfontes, situado na foz do Rio Mira, em pleno centro histórico de Vila Nova
de Milfontes, no Alentejo.
Construído a partir de um
conjunto de ruínas já na segunda metade do Século XX, o edifício, com uma
posição privilegiada sobre um dos mais bonitos recantos de Portugal, deslumbra
quem dele se acerca há já muitos séculos. De facto, está comprovada a sua
origem Fenícia, tendo sido também identificados vestígios arqueológicos dos
períodos Grego, Cartaginês e Romano, durante os quais a posição estratégica do
edifício era essencial para a defesa da barra do Rio Mira.
De facto, foi precisamente nos
períodos de maior instabilidade marítima, quando o corso e a pirataria mais se
desenvolveram, que o antigo castelo conheceu as suas principais benfeitorias.
No final do Século XVI, depois de um ataque cerrado à zona costeira alentejana
então sob domínio filipino, Filipe II de Portugal decide construir ali um forte
de características modernas que fosse capaz de resolver o problema imenso de
insegurança criado pelo fácil acesso marítimo à povoação. As obras arrancam
desde logo, assim que o monarca solicita a Alexandre Massai, que nessa altura se
encontrava a reconstruir o Forte de Porto Côvo, junto à Ilha do Pessegueiro, os
planos para a criação de um baluarte marítimo em Milfontes.
O posterior assoreamento do rio e
a perda da importância estratégica e comercial daquela região, complementada
com a restauração da independência de Portugal e pela falta de meios humanos e
técnicos para garantirem a manutenção do edifício, conduzem, como aliás aconteceu
com muitos espaços de índole semelhante colocados um pouco por toda a costa
Portuguesa, a um processo de progressivo abandono e desleixo. A ruína foi-se
instalando e o Forte de São Clemente sobreviveu quase por milagre depois de ter
sido envolvido num processo rocambolesco de vendas sucessivas quando no Século
XX a república se instalou em Portugal.
Depois de ter sido vendido em
hasta pública, rendendo menos de 500000 Reis ao Estado, foi novamente revendido
a um novo proprietário particular que, dado o estado avançado de degradação no
qual o edifício se encontrava, acabou por não ter os recursos suficientes para
o recuperar.
Já na década de 30, mediante o
perigo de desmoronamento do forte, a Câmara Municipal de Odemira ponderou a sua
expropriação para posterior demolição e somente a falta de recursos por parte
daquela depauperada autarquia garantiu o insucesso dessa funesta intenção.
Novamente vendido a um particular em 1939, que recuperou integralmente o espaço
e o adaptou a residência pessoal, foi possível devolver ao Castelo de Milfontes
a dignidade que ele merece.
Residente em Lisboa, o novo
proprietário resolve transformar o forte numa espécie de pousada turística,
fazendo assim com que o Forte de São Clemente tenha sido um dos primeiros
projectos de turismo rural existentes em Portugal!
Mais tarde, já em 2009, voltou a
ser vendido a particulares, facto que se repetiu já em 2016, tendo estado o
edifício anunciado para venda por 3.500.000,00 €! Substancialmente mais do que
os 464.000 Reis de 1903…
Classificado como Imóvel de
Interesse Público e 1978, o Forte de São Clemente é hoje uma peça fulcral na
identidade de Vila Nova de Milfontes, carregando uma mística que transporta
consigo as emoções, os sonhos e os anseios de mais de mil anos de uma histórica
muito atribulada.