O Monte Estoril é um dos mais fantásticos recantos do Concelho de Cascais. Resultando da conjugação de diversos factores extraordinários, para ali confluíram diversos contributos que transformaram o antigo Pinhal da Andreza num sítio pleno de charme e cheio de segredos e de histórias que o tornaram muito especial.
A visão dos seus fundadores,
mesclada pelo carácter onírico que muito contribuiu para o encanto romântico
que todos lhe reconhecem, foi a pedra basilar que sustentou um projecto
arrojado e determinante que haveria de dar o mote para o subsequente nascimento
dos Estoris e para a consolidação de Cascais como destino turístico de excepção
em termos internacionais.
Mas o Monte Estoril beneficiou
ainda do carácter visionário de muitos dos seus moradores que, desde o final do
Século XIX, têm sido capazes de recriar o espaço em torno de uma vivência
social e cultural única que foi sempre determinante para a consolidação da
estrutura urbana em que a povoação assenta.
Tendo sido o primeiro projecto
urbanístico criado de raiz em Portugal, o Monte Estoril foi cadinho de
experiências diversas que a memória local ainda consegue preservar. Do “Jazigo”
de Manuel Duarte aos torreões altivos da “Vivenda Miramonte”, passando pelo
autêntico castelo do antigo “Hotel Miramar” ou pela selva romântica que ainda
sobrevive da inesquecível “Villa Montrose”, são muitos os exemplos de peças
arquitectónicas cenograficamente integradas na localidade e que constroem no
Monte Estoril um ambiente irrepetível em qualquer outro lugar de Portugal.
Mas, como pérola que é, o Monte
Estoril foi sempre também alvo privilegiado da cobiça, do desnorte eleitoral e
da incapacidade política que pontualmente vai afectando a vida neste concelho.
Foi-se salvando, sem se livrar de pontuais atentados contra a sua excelência
perpetrados aqui e ali ao longo dos tempos, pela argúcia, capacidade de entrega
e devoção imensa dos Monte Estorilenses que desde sempre foram imbatíveis na
defesa dos interesses do local.
Em 2002, quando Cascais começava
a respirar de alívio depois da autêntica onda de betonização que varreu o
concelho desde meados da década de 80, a Associação de Moradores do Monte Estoril
preparou um plano global de salvaguarda urbana e patrimonial que entregou à
edilidade cascalense.
O projecto,
intitulado “PIRME – Projecto Integrado de Requalificação do Monte Estoril”, foi
uma das mais inéditas e inovadoras propostas de requalificação urbanística
jamais realizadas em Portugal, apresentando uma visão independente e livre de
um grupo muito vasto de moradores, comerciantes, hoteleiros e demais operadores
que trabalhavam no local. Da comissão promotora faziam parte Alfredo Dias Valente de Carvalho,
António Pinto Coelho de Aguiar, Diogo Velez Mouta Pacheco de Amorim, Jaime
Roque de Pinho de Almeida (Lavradio), João Aníbal Queirós Felgar Veiga Henriques,
Joaquim Manuel Cardoso Mendes, José Francisco Gomes Santos Fernandes, José Luís
de Athaíde de Almeida e Silva, Luís Miguel Lupi Alves Caetano, Manuel Pinto
Barbosa, Paulo Ribeiro Maia de Loureiro e Salvador Correia de Sá.
Tinha
como objectivo principal, para além de recriar um perímetro de protecção em
torno das fronteiras urbanas do Monte Estoril, o de garantir que os moradores
cumprissem aquilo que consideravam o seu
dever participar na gestão e na orientação dos destinos da sua terra. Diziam de
forma sublinhada que o fazia “à margem dos partidos políticos, mas não contra
eles”, com uma forma de participação responsável, cordata e consciente. Mas
também exigente…
Como é fácil de perceber, a qualidade
incontestável do documento, atestado até pelas mais proeminentes autoridades
políticas do Cascais de então, em nada influi nos destinos do Monte Estoril. A Sua
independência relativamente aos muitos interesses de toda a ordem que sempre
sobreviveram naquele local, condenou-o ao fracasso e a uma frustrante viagem em
direcção ao caixote do lixo.
Com a entrada em vigor do novo PDM –
Plano Director Municipal, que não assume a vocação municipal do concelho e que,
por isso, não define as linhas programáticas estratégicas que hão-de marcar a
existência urbanística do Concelho durante o seu período de vigência,
alterou-se de forma substancial a política de salvaguarda patrimonial no Monte
Estoril. Ao contrário do que até aqui existia, o novo PDM renega a unidade
urbanística da localidade, composta por um conjunto de edifícios que a própria
AMME inventariou e integrou no PIRME, e aposta numa apreciação casuística das
intervenções que venham a ocorrer nos limites da localidade. Faz depender,
desta forma, todo e qualquer projecto que venha a surgir do gosto específico de
quem o aprecia. E assim, destruindo a unidade urbanística que deu corpo à
excelência deste local, coloca em risco o carácter único e especial que ainda
caracteriza o Monte Estoril, abrindo portas para quase tudo seja possível fazer.
Nesta época de mudança profunda que
agora começa, importa homenagear a AMME pela coragem e determinação que colocou
na apresentação deste inédito projecto. E relembrar todos os Cascalenses de que
o Monte Estoril tem sido capaz de defender o seu carácter extraordinário desde
meados do Século XIX.