por João Aníbal Henriques
Há alguns anos atrás (talvez
bastassem dez) os resultados das eleições de ontem na Catalunha deixariam
perplexos todos aqueles que para eles olhassem com um mínimo de atenção. Em
primeiro lugar porque quem ganhou perdeu e quem perdeu ganhou… e, depois,
porque ficou evidente a fragilidade nacional espanhola bem como a solidez
estrutural da federação que os Reis Católicos recriaram há mais de 500 anos.
Se é certo que os
independentistas catalães ganharam as eleições por terem conseguido eleger um
maior número de deputados, é certo também que perderam as eleições por terem
tido menos votos. Numa analogia muito pertinentes com o que pode vira passar-se
em Portugal no próximo Domingo, os catalães demonstraram que perceberam bem a
incoerência do sistema eleitoral que a Europa continua a utilizar que, nada
traduzindo da realidade que temos, se distancia progressivamente dos cidadãos e
impede a sua real representatividade e, logo, os fundamentos da própria
democracia. Os que votaram, fizeram-no completamente divididos e profundamente
desvinculados das causas imensamente fracturantes que estavam em causa. Os outros,
ou sejam, os pouco mais de 22% de catalães que não quiseram participar neste
acto eleitoral, vieram ainda reforçar mais este fenómeno de afastamento
político, considerando-se mais grave ainda por se saber que dele dependia uma
das mais importantes e impactantes decisões da História da Espanha.
Sendo estranho e muito complexo o
cenário que resultou destas eleições, é linearmente o fim da linearidade que
tem presidido à definição da realidade política na Europa, ajudando a
clarificar e a explicar muitos dos fenómenos fracturantes que ultimamente têm
sido apanágio do quotidiano no velho continente. As questões que se prendem com
as dúvidas relativamente às dívidas soberanas, os resgates impulsionados pelos
organismos internacionais, a tentativa de interferência nas políticas nacionais
por parte da Alemanha federal ou mesmo as mais recentes (e intoleráveis)
incertezas com a chegada dos refugiados, ganham uma nova perspectiva à luz do
grito que ontem proferiram muitos catalães.
Em relação a Portugal, fracturado
sem se saber muito bem porquê, dado que todos os candidatos às eleições de
Domingo (radicalismos eleitoralistas à parte) concordam no essencial acerca
daquilo que seria a sua opção política caso vençam o plebiscito, muito se
esclarece em relação à incompreensível sobrevivência política da coligação
PSD-CDS e ao também incompreensível desnorte de um PS aparentemente incapaz de
lidar com a sua história. E se tudo está em aberto em relação às eleições
legislativas que aí vêem, o certo é que aconteça o que acontecer o
aparentemente estranho caso da Catalunha nos vem mostrar que um mundo novo e
uma Europa diferente da que temos está prestes a nascer.
Porque já nada é o que era
dantes.