quarta-feira

Duarte d'Almeida - Decepado por Portugal




Numa época de profunda anomia como é aquela que actualmente atravessamos, na qual são poucos aqueles que ousam pensar e agir em acordo com a sua consciência e em nome de princípios e valores que são essenciais à vida, assumem especial importância os exemplos dos que foram capazes de se transcender em nome de Portugal.

O ser capaz de oferecer a própria vida sem esperar recompensa alguma, sempre sentido que vale mais morrer vivendo do que viver morrendo, é uma qualidade rara mas que surgiu pontualmente e em momentos muito importantes ao longo da nossa História.

Pouco conhecido na actualidade, apesar de a sua História de Vida ter sido contada e recontada como exemplo em inúmeros livros ao longo de muitos séculos, Duarte d’Almeida – o Decepado de Toro – foi figura central no Portugal do Século XV. Com a sua coragem, entrega e motivação, ofereceu a Portugal a possibilidade de se manter livre e independente, criando simultaneamente as condições necessárias para que se concretizassem os grandes feitos das descobertas.

Importa conhecer, perceber, compreender e aprender com a História de Duarte d’Almeida num início de século ávido de heróis que sejam capazes de oferecer as suas mãos para salvar este nosso Portugal…

Filho de Pedro Lourenço de Almeida e Alferes-mor de D. Afonso V, ficou conhecido na história pela alcunha do Decepado.

Ganhou notoriedade na batalha de Toro, em 1 de Março de 1476, que colocou frente-a-frente as tropas portuguesas e castelhanas, devido aos seus actos de abnegação, valentia e heroísmo.

A luta foi enorme; as quatro grandes divisões castelhanas, vendo os seus em perigo, acudiram a auxiliá-los, ao mesmo tempo que o arcebispo de Toledo, o conde de Monsanto, o duque de Guimarães e o conde de Vila Real avançavam em socorro dos portugueses.

Subjugados pela superioridade do número, os portugueses caíram em desordem, abandonando o pavilhão real. Imediatamente, inúmeras lanças e espadas o cobrem, e todos à porfia pretendem apoderar-se de semelhante troféu. Duarte de Almeida, num supremo esforço, envolto num turbilhão de lanças, empunha de novo a bandeira, e defende-a com heróica bravura. Uma cutilada corta-lhe a mão direita; indiferente à dor, empunha com a esquerda o estandarte confiado à sua Honra e lealdade; decepam-lhe também a mão esquerda; Duarte de Almeida, desesperado, toma o estandarte nos dentes, e rasgado, despedaçado, os olhos em fogo, resiste ainda, resiste sempre. Então os castelhanos o rodearam, e caiem às lançadas sobre o heróico alferes mor, que afinal, cai moribundo. Os castelhanos apoderaram-se então da bandeira, mas Gonçalo Pires conseguiu arrancá-la. Este acto de heroicidade foi admirado até pelos próprios inimigos.

Duarte de Almeida foi conduzido semimorto para o acampamento castelhano, onde recebeu o primeiro curativo, sendo depois mandado para um Hospital de Castela. No fim de muitos meses, voltou à, pátria, e foi viver para o castelo de Vilarigas, que herdara de seu pai. Havia casado com D. Maria de Azevedo, filha do senhor da Lousã, Rodrigo Afonso Valente e de D. Leonor de Azevedo. Diz-se que Duarte de Almeida morreu na miséria e quase esquecido, apesar da sua valentia e bravura com que se houve na batalha de Toro, que lhe custou ficar inutilizado pela falta das suas mãos. Camilo Castelo Branco, porém, nas Noites de insónia, diz que o Decepado não acabara tão pobre como se dizia, porque além do castelo de Vilarigas, seu pai possuía outro na quinta da Cavalaria, e em quanto ele esteve na guerra, sua mulher havia herdado boa fortuna duma sua tia, chamada D. Inês Gomes de Avelar. D. Afonso V, um ano antes da batalha, estando em Samora, lhe fizera mercê, pelos seus grandes serviços, para ele e seus filhos, de um reguengo no concelho de Lafões
”.

Adaptado do livro “Midões e o Seu Velho Município” da autoria de António Duarte d’Almeida Veiga (Benavente, 1905) e do “Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico”, Volume I, pág. 245.