por João Aníbal Henriques
Situada no Coração de Lisboa, no
centro da Praça do Comércio (antigo Terreiro do Paço) e estrategicamente
colocada entre o Arco Triunfal da Rua Augusta e o marco simbólico do Cais das
Colunas, a estátua equestre do Rei Dom José é um dos mais impressionantes e emblemáticos
monumentos da cidade.
Muito ligado à reconstrução pombalina
de Lisboa após o grande terramoto de 1755, o convite formulado ao escultor
Joaquim Machado de Castro foi feito ainda antes do cataclismo, em 1750, e ficou
envolvido em várias polémicas. Em primeiro lugar porque o escultor teve de
seguir os desenhos realizados por Eugénio dos Santos e, depois, porque ainda
foi obrigado a adaptá-los à forma do pedestal já concebido por Reinaldo Manuel
dos Santos.
O significado simbólico da
estátua, envolto em várias interpretações de cariz variado e muitas vezes contraditório,
assentam no dito plano maçónico que o Marquês de Pombal terá utilizado como
base do plano de reconstrução da própria cidade.
Concebida como um templo antigo,
a própria Praça do Comércio surge carregada de simbolismo, valendo a pena ler
com atenção os muitos e muito profundos estudos realizado pelo investigador
Vítor Adrião sobre este assunto e acessíveis através do site Lusophia.
De qualquer maneira, importa
referir que todo o quadro que envolve a imagem surge marcado por uma identidade
que não é linear e que, mesmo no carácter assimétrico da figura real, deixa
antever mistérios que ninguém revelou de forma total. A alegoria às vitórias na
Ásia e na América, associada à fama e ao triunfo de Portugal, estão bem
patentes nas serpentes e nas figuras que envolvem o Rei e o seu cavalo.
A inovação deste trabalho, que
foi a primeira representação equestre de um Rei em espaço público recuperando
os valores estéticos da Antiguidade Clássica, é vincada pelo facto de ter sido
fundida numa só peça e ao longo de apenas 7 minutos. Tecnicamente diferente de
tudo o que tinha sido feita até então, foi uma das muitas experiências bem conseguidas
que o Tenente-Coronel Bartolomeu Costa realizou no Arsenal do Exército e que
tantas repercussões tiveram na História da Arte Portuguesa e na própria Cidade
de Lisboa.
As suas enormes dimensões, e o
facto de não poder ser puxada por animais, transformou o transporte entre o
local da fundição e a Praça do Comércio numa enorme aventura que se encaixou de
forma firme na História de Lisboa. Num percurso épico que se prolongou ao longo
de 4 dias, a estátua foi carregada por mais de 1000 homens e obrigou à
construção de uma estrada para o efeito e à demolição de casas particulares,
igrejas e de outros monumentos que se interpunham no caminho em direcção à
frente ribeirinha da cidade.
Por fim, no dia da sua
inauguração, em 6 de Junho de 1775, causou estranheza o facto de o Rei não ter
estado presente na cerimónia que foi presidida pelo próprio Marquês de Pombal.
Esse facto, no entanto, ficou a dever-se mais ao protocolo de linha Francesa
que se seguiu, e que colocava o Rei em posição de honra na presidência da
cerimónia por ser ele o homenageado na estátua, do que a qualquer tentativa de
reforço do poder pessoal do primeiro-ministro de Dom José.
Este, por seu turno, juntou ainda
mais uma polémica à estória do monumento, ao colocar, na face virada para o
Tejo, um medalhão de bronze com a sua imagem e que foi retirado depois das
polémicas políticas instauradas pela Rainha Dom Maria I. O medalhão regressou
ao seu local de origem, onde ainda hoje pode ser visto, em 12 de Outubro de
1833 pelas mãos do Governo Liberal.
Por fim, importa reter a teimosia
do Rei que se recusou a posar para a estátua, facto que obrigou a utilizar a
cara que estava patente numa das medalhas que circulavam na cidade… as mãos da
estátua, por exemplo, foram moldadas a partir das mãos do próprio escultor…
Em suma, é de mistério e de lenda
que se constrói um dos mais extraordinários e inesquecíveis recantos da Cidade
de Lisboa!