por João Aníbal Henriques
Há espaços que parecem marcados
pela falta de sorte… ao longo dos tempos que dão forma ao tempo, sobrevivem a
custo às atrocidades que só acontecem de quando em vez. Menos ali, onde as
probabilidades são reduzidíssimas mas as catástrofes teimam em acontecer
ciclicamente.
É o que acontece nos Paços do
Concelho de Lisboa. Instalada ali desde o final do Século XVIII, quando o
esforço de recuperação da baixa depois do grande terramoto de 1755 permitiu a
construção de um edifício condigno para as reuniões municipais, a Câmara
Municipal de Lisboa estreou instalações de grande qualidade fruto do traço
proeminente do arquitecto Eugénio dos Santos Carvalho.
Mas foi sol de pouca dura. No dia
19 de Novembro de 1863, menos de cem anos depois da inauguração, um violento
incêndio destruiu por completo os Paços do Concelho, obrigando à construção do edifício
actual.
A construção, que demorou desde
1865 e até 1880, integrou na fachada o grande frontão de linha neoclássica que,
sendo da autoria do escultor Francês Anatole Calmels, veio alterar de forma
significativa o projecto original assinado pelo arquitecto Domingues Parente da
Silva. A decisão, tomada pelo engenheiro municipal Ressano Garcia, abriu
caminho para uma intervenção estética mais alargada que transformou o edifício da
Câmara Municipal num dos mais impactantes monumentos da renovada baixa
Lisboeta.
No interior, em que intervieram
José Pereira Cão, Columbano e Malhoa, foi reforçado o valor pictórico próprio
do romantismo novecentista, facto que favoreceu a qualidade final do edifício e
o interesse que o mesmo despertou junto dos munícipes de Lisboa.
Mas não ficaram por aqui as
vicissitudes terríveis que afectaram este espaço. Em 1996, no dia 7 de
Novembro, outro incêndio devastou o interior do espaço municipal, obrigando a
nova intervenção de fundo que lhe conferiu o aspecto que actualmente conhecemos.
A opção mais recente, tomada pelo
Arquitecto Silva Dias, que liderou a equipa que efectuou a recuperação, foi
reaproximar o mais possível o edifício do projecto original de Parente da
Silva, fazendo desaparecer muitos acrescentos e revisões impostas pelas necessidades
que a História havia imposto aos serviços camarários. Nesta obra intervieram por
convite da edilidade Lisboeta os arquitectos João de Almeida, Manuel Tainha,
Nuno Teotónio Pereira, Daciano Costa e os artistas Sá Nogueira, Fernando
Conduto, Maria Velez, Helena Almeida, Pedro Calapez e Jorge Martins.
Depois de o seu varandim ter
servido de palco para inúmeras cerimónias que ali decorreram de forma oficial,
o edifício da Câmara Municipal de Lisboa é hoje um monumento incontornável numa
visita à cidade, marcado de forma muito perene pela Implantação da República
que ali aconteceu no dia 5 de Outubro de 1910.