Entre 1580 e 1640, Portugal
atravessou um dos mais negros períodos da sua História e Cascais desempenhou um
papel essencial neste triste episódio. A traição do então Senhor de Cascais,
que num acto hediondo vendeu a Nossa Terra à Coroa Espanhola, contrastou com a
coragem heróica com a qual D. Diogo de Menezes defendeu Portugal. Pagou muito
caro pela sua lealdade e foi indignamente executado na Cidadela de Cascais em
1580, deixando atrás de si uma lenda de glória que o tempo não vai conseguir
destruir…
por João Aníbal Henriques
A perda da independência
nacional, em 1580, foi um dos episódios mais negros da História de Portugal.
Fruto da imberbe actuação do Rei Dom Sebastião no Norte de África, e dos muitos
interesses que desde sempre corporizaram o poder político Português, o país
mergulhou na sua maior crise de sempre, entregando o trono de Portugal ao usurpador
Espanhol.
Apesar do então Senhor de Cascais
ser traiçoeiramente partidário das pretensões de Filipe II de Espanha, o povo
de Cascais não hesitou em apoiar a causa de Dom António, Prior do Crato,
participando activamente na sua aclamação como Rei de Portugal. Até à
implantação da república, em 1910, manteve-se na toponímia Cascalense uma
homenagem sublime ao monarca Português, consubstanciada numa “Rua D. António I”,
representando simbolicamente o leal apoio de Cascais à Causa Nacional.
Nessa altura crítica, quando o
Rei Dom António escolhia os seus mais fiéis e bravos apoiantes para defender
Portugal do avanço das tropas Espanholas, D. Diogo de Menezes, que tinha sido
Governador de Ormuz e Vice-Rei da Índia, foi nomeado General e colocado como
Comandante da Fortaleza de Cascais.
Soldado experiente e bem
preparado, D. Diogo de Menezes organizou as suas parcas forças de forma a
assegura a inexpugnabilidade da fortificação Cascalense perante o ataque
Espanhol. E, quando no dia 27 de Julho, o Duque d’Alba desembarca em Sesimbra,
Cascais estava a postos para defender Portugal.
Mas o Senhor de Cascais,
acompanhado da sua cáfila de meia-dúzia de traidores, empenha-se em entregar
aos invasores informações detalhadas sobre a defesa da terra, permitindo ao
Duque d’Alba desembarcar inesperadamente na Lage do Ramil, junto ao Farol da
Guia. E, não satisfeito com a sua traição, organiza a corja que o acompanha de
forma a conseguir abrir as portas da fortaleza, onde D. Diogo de Menezes
defendia activamente a Causa Portuguesa.
Derrotado pela diferença abissal
de forças entre o seu pequeno contingente Cascalense e a enormidade do exército
Espanhol, Diogo de Menezes é capturado depois de uma batalha renhida e terrível
e invoca as leis da honra e da cavalaria para, em conformidade com a sua alta
posição hierárquica dentro das tropas do Rei Dom António, o deixarem regressar a
Lisboa para ajudar o monarca. Mas o invasor Espanhol, num acto que subverte a
própria honra militar, manda executar o herói Português na própria parada da
fortaleza…
Conta o historiador espanhol António
de Herrera y Tordesillas que “eram
quatro da tarde e estava a praça apinhada de piques e arcabuzes alemães, e no
meio dela via-se o cadafalso, onde o sangue nobre ia sujar os brasões de um dos
maiores de Espanha, fazendo-o expiar as nódoas estampadas pela venialidade de
haver esquecido quem era e o que devia aos seus antepassados e ao reino de
Espanha”…
E na mesma linha, sublinhando a
dignidade heróica de D. Diogo de Menezes na defesa corajosa da liberdade de
Portugal, Ferreira de Andrade não hesita em indicar a traição do Senhor de Cascais
como um dos actos mais ignóbeis da nossa História, em linha com a falta de
dignidade e de honra que caracterizou a decisão brutal do Duque d’Alba: “Assim
morreu nesta vila de Cascais um dos mais nobres e honrados fidalgos de então,
pelo crime horrendo de ser Português. Uma mancha de sangue marcaria para
sempre, como um estigma de ignomínia, os gloriosos feitos do grande general de
Filipe II”.
D. Diogo de Menezes, heróico
defensor da Portugalidade, morreu em Cascais a lutar ao lado dos Cascalenses
pela defesa da independência de Portugal. A sua memória, parte maior da Memória de
Cidadania desta Nossa Terra, é pilar estrutural da Identidade Municipal.
Promover a memória dos seus
feitos e a coragem que demonstrou ter na defesa de Portugal, é assim obrigação
de Cascais, onde o seu sangue jorrou perante o desespero dos Cascalenses de
então. Porque dos ecos da sua grandeza se retiram lições fundamentais para
preparar o futuro das próximas gerações…