por João Aníbal Henriques
A união matrimonial entre o Rei
Dom Dinis de Portugal e a Rainha Santa Isabel de Aragão, configura um dos mais
emblemáticos e enigmáticos momentos da História de Portugal. Os cônjuges, ambos
predestinados para os desafios do espírito e para o cumprimento na Terra da
vontade do Altíssimo, concretizam a sua vida cada um à sua maneira mas, por
intervenção do próprio destino, complementando-se numa amálgama de sucesso que
haveria de mudar a vida de Portugal.
O Rei poeta e artista, fadado
para um destino enorme assim que o seu pai começou a sofrer os primeiros
padecimentos da doença que o havia de matar, assumia em si próprio a dupla
função de governante e de alquimista, contribuindo de forma decisiva para a
concretização em Portugal de grande parte das mais influentes correntes de
pensamento que existiam no Mundo de então.
Os Cavaleiros Templários, Ordem
Religiosa mítica que havia sido determinante no processo das Cruzadas e na
recuperação do saber primordial Cristão que estava guardado de olhares impuros
na Cidade de Jerusalém, foram extintos por ordem papal em 1312. Dom Dinis, do
alto da pequenez do seu aparentemente minúsculo País, consegue transmutá-los
numa ordem diferente, salvando os seus bens materiais e o tesouro maior que
consigo carregavam ao longo dos eras e dos tempos.
E foi Dom Dinis, plantador das
naus que hão-de levar os Portugueses a dar novos mundos ao Mundo, quem recriou
em Portugal a universidade, assumindo a sua costela trovadoresca que transforma
emoções de alma em pão e novo sangue.
A Rainha Santa Isabel, por seu
turno, transforma também ela a matéria. As rosas, símbolo alquímico da cruz
viva e em permanente movimento, transformam-se em pão, mantendo na carne o odor
radioso de alguém que vive lá em cima…
Da união dos dois, em rios que
permanentemente transbordam deixando marcas em ambas as margens, nasce então a
cabeça do Império Português, misto de fénix e serpente que define os ciclos diferentes
e um país tão especial quanto este.
Dom Dinis e Santa Isabel, unidos
amiúde no caldeirão alquímico das nascentes sagradas que existiam junto a
Leiria, ocupam num monte distante o espaço que há-de transformar-se no mais singular
dos Paços Reais de Portugal. Ali, na encosta subliminar do Ulmar que permite
deslumbrar as vistas com o Vale do Liz, rio e pureza simultaneamente, dão nome
a uma nova terra que se manterá incólume na História de Portugal: Monte Real.
O Paço de Monte Real, acanhado
nas dimensões que sobreviveram mas enorme no espaço que se gerou da união
simbólica e concreta entre o Rei Pensador e a Rainha Santa, é hoje uma sombra
do que foi, mas assume-se como testemunho inultrapassável daquela que foi a
história maior de todas aquelas que ajudaram a construir Portugal.
Tenha sido a reconstrução de um
castro pré-histórico que já ali estava quando o Rei chegou, como defende João
de Almeida, ou um paço singelo construído de raiz para acompanhar a plantação
do Pinhal de Leiria e para a Rainha poder usufruir das águas milagrosas que
nasciam no local, o certo é que o Paço de Monte Real é a marca perene da
capacidade empreendedora de um dos reis maiores da história nacional.
Do Paço de Monte Real, terá Dom
Dinis antevisto o Portugal que hoje temos. Só assim se explica, como Pessoa bem
refere, a intervenção da Coroa na defesa e adaptação dos antigos Templários que
no nosso País renascem, como a fénix das cinzas, como a Ordem de Cristo. E qual
é o símbolo maior dessa ordem nova que nos espreita do alto da sua vetusta
idade? A cruz de Cristo, ou melhor, a Rosa Vermelha que a Rainha Santa Isabel
carregava ao peito.
Coincidências ou não, certo será
que a intervenção deste casal real abriu portas ao Mundo Novo e que tudo isso
aconteceu no Paço de Monte Real. É obrigatória uma visita demorada, antevendo
nas inexistências toda a importância que teve e tem. É essencial que este
espaço assuma o lugar de destaque que deve ter na definição maior da Identidade
Nacional.