por João Aníbal Henriques
A dicotomia entre o mal e o bem,
num jogo em que as memórias efectivas se misturam amiúde com as entoações
próprias dos sonhos, assume especial importância na Boca do Inferno, em
Cascais, um recanto encantado no qual se conjuga uma paisagem extraordinária com
uma inesquecível história.
Diz a lenda que naquelas
paragens, num castelo cujas memórias pétreas nunca chegaram a olhos humanos,
vivia um gigante maligno que padecia do maior dos males que afectam a
humanidade: o amor. Profundamente apaixonado por uma donzela maravilhosa que
não o correspondia, resolveu tomar medidas drásticas e consumar o seu amor de
forma subliminar. Montado no seu cavalo, atacou o palácio onde a donzela vivia
com o seu pai e raptou-a levando-a para o seu castelo de Cascais.
A donzela, apaixonada por seu
turno por um ilustre cavaleiro que há muito a cortejava, não cedeu às intenções
do gigante. E este, para apaziguar o seu ímpeto, fechou-a no alto da maior
torre do seu castelo, prendendo-a até que ela se convencesse da necessidade de claudicar
ao amor que ele lhe queria dar.
Mas o noivo apaixonado, tomado da
força que só o amor consegue despoletar, insinuou-se no castelo e conseguiu libertou
a sua amada, fugindo dali numa cavalgada desenfreada no seu magnífico cavalo
branco que quase parecia voar.
O gigante, quando deu conta da
fuga da donzela ficou furioso. Com artes mágicas que só ele conhecia e os
ímpetos malignos que a fúria imensa havia despertado, lançou uma praga sobre os
fugitivos e sobre eles fez crescer uma enorme tempestade.
Apanhados pela intempérie nuns
rochedos junto ao mar, o casal de apaixonados tudo fez para conseguir fugir da
influência do seu maléfico perseguidor. Mas, provocando um sismo que partiu as
arribas e fendeu o chão, o gigante fez abrir sob os seus pés um enorme buraco
onde ambos caíram com o seu cavalo e onde desapareceram para sempre sem eixar
rasto.
Estava aberta a porta para o
inferno e esta jamais se voltaria a fechar…